Como tem sido comum no Brasil há algum tempo, nos últimos dias jornalistas voltaram a ser alvos de ataques verbais enquanto faziam o seu trabalho. Nossa atividade sempre foi controversa, ser confrontado não é novidade. O jornalista normalmente contraria interesses no seu dia a dia, o que faz o “simpático” de hoje ser o “inimigo” de amanhã, se achar que alguma abordagem é injusta ou “tendenciosa”. O que parece haver de diferente hoje é a recorrência e a virulência dos xingamentos, o que talvez se explique pela influência das redes sociais. É nelas que as manifestações destemperadas viram material de aglutinação dos simpatizantes, sempre prontos a aplaudir quem os “representa”.
A pergunta que se deve fazer é por que tem sido interessante, para muitos segmentos, buscar desconstruir o jornalismo. A resposta está em como se organiza boa parte da sociedade brasileira hoje. É natural pensar que o conhecimento e a inteligência são construções, algo que se faz ao longo dos anos com a conhecida ferramenta da educação. Mas a realidade que os “novos tempos” trouxeram, e com o qual ainda estamos nos acostumando, é que a ignorância também é uma construção, como recentemente vi abordado em artigo da revista Radis, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Não seria correto pensar que o ignorante é assim porque não tem acesso às informações; o que ele tem é uma forma peculiar – e errada – de interpretar o que lê e ouve, porque foi “treinado” para isso por variadas ferramentas, como os vídeos compartilhados no WhatsApp e as publicações no Facebook.
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Portanto, faz mesmo todo sentido atacar quem lida profissionalmente com informação e é identificado com o rótulo
que o “comandante” da vez determina que se use. São ofensas pelas redes sociais, mas também impropérios ao vivo, algo que ocorre de forma corriqueira pelo país afora e também em Santa Cruz do Sul, como já experimentaram colegas em coberturas de manifestações supostamente pacíficas. Como é incomum surgir alguma reação de indignação e de defesa desses profissionais, a mensagem que deve ficar, especialmente aos mais jovens, é de resistência. Em nome da atividade e, por extensão, da liberdade de informação e da democracia.
Penso que jornalismo é um conceito, mais até que uma prática. É algo que simplesmente tem que existir, com total liberdade, uma salvaguarda da qual a sociedade não pode abrir mão. A parte que nos toca neste momento é perseverar, apesar da intimidação e até das tentativas de censura prévia. É enfrentar os desvairados enquanto eles mentem incansavelmente, tentando tornar realidade o que é ficção.
Não podemos desistir.
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