Nas semanas iniciais do primeiro governo Lula (2003), eu escrevera um artigo sob o título “Carta ao presidente Lula”. Ou seja, escrito há 13 anos. Seria o primeiro de vários textos com o mesmo título. Reproduzo-o parcialmente no que de essencial e premonitório.
“A euforia e a expectativa de mudança trazem em seu bojo a permanente ameaça da prepotência e da arrogância. O grande desafio do presidente é a conciliação entre a realização do possível e do viável (…), sem deixar levar-se por pregações revanchistas ou delírios juvenis, a exemplo de algumas utopias que o tempo e a história desmascararam.
Essa precaução justifica-se haja vista vários exemplos locais e mundiais. Em nome das utopias e das ideologias patrocinou-se inúmeras formas de intervenção (…) sob a pretensão de ‘mostrar caminhos ou ensinar ao outro o lado certo das coisas, da vida, da história, da felicidade, etc…’
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A diferença está no centro de nossos encontros e desencontros. A incompreensão da diferença é o núcleo de nossas guerras públicas e particulares. Construímos as diferenças sobre razões reais e imaginárias. Mais sobre as imaginárias do que sobre as reais.
Quanto mais construímos e aceitamos as diferenças, mais humanos e plenos nos tornamos. Mas, ironicamente, a soberba e a arrogância fazem pensar e determinar que algumas diferenças são mais sábias que outras, são ‘mais certas’ e ‘mais civilizadas’ que outras.
Logo, nesses termos, a diferença passa a constituir uma diferença irreversível, uma razão desumana, uma vontade de subjugação. Não é a toa que ao invés de vivermos a plenitude das diferenças, estamos, novamente, vivendo a plenitude ‘das guerras’. Repito: uma diferença irreversível, uma vontade de subjugação.
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Como seu eleitor durante todos estes anos, nas suas quatro tentativas, tenho a esperança de que suas andanças tenham desenvolvido esse sentimento, essa compreensão acerca do sentido da diferença.
Notadamente a compreensão sobre os inúmeros BRASIS que convivem sobre o mesmo solo, na mesma pátria, e consiga distinguir qual deles deva ceder, qual deles deva sofrer rupturas, sem permitir, em erro de avaliação e ação, que a fragilização de um comprometa a realização dos demais BRASIS.
O sonho de um grande e único Brasil não exige, necessariamente, o fim de inúmeros pequenos e ativos Brasis.”
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Lula confessou várias vezes que não lê. “Que dava sono”, afirmara. Suponho que mais gente deva ter escrito algo nesse tom e alerta, à mesma época. Pena que Lula não leu!