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A arte de detectar mentiras

Não é porque alguém acredita ou deseja acreditar em alguma coisa que ela é verdade. Então é necessário lembrar, nos dias de hoje, do cientista norte-americano Carl Sagan (1934-1996). Quando ele escreveu um de seus últimos livros, O mundo assombrado pelos demônios, ainda não existiam as redes sociais, a “pós-verdade” e as fake news como fenômeno de massa. E é um pouco desanimador constatar o quanto os temores de Sagan em relação à corrosão do debate público por afirmações irracionais, crédulas demais ou genuinamente mentirosas se confirmaram – justamente numa época em que existem tantas formas de checar o que é fraude ou não. 

Pois em dos capítulos de O mundo assombrado pelos demônios – “demônios” que nada são além das superstições, preconceitos e fanatismos que infelizmente não saem de moda – Sagan propõe um “kit básico” para detectar mentiras, usando apenas o pensamento cético e crítico. Exercícios mentais. Afinal, quais as consequências de aceitar qualquer informação sem contestar? Nossa necessidade de crer, de dar sentido às coisas, pode muitas vezes ser um problema.

Em primeiro lugar, diz Sagan, é preciso confirmar o que é “verdade” mediante um debate sério sobre evidências, no qual todos os pontos de vista sejam examinados. Argumentos de autoridades podem não ter muito peso – pois, como ele mesmo observa, com sua autoridade, “autoridades já cometeram erros no passado e voltarão a cometê-los novamente no futuro”. Pois é. 

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Segundo: diante de um problema, crie mais de uma hipótese. Se há algo que exige explicação, pense em todas as maneiras diferentes pelas quais poderia explicá-lo. Depois, questione e tente refutar sistematicamente cada uma das alternativas. O que sobreviver entre as muitas hipóteses tem mais chance de ser a resposta correta do que se você tivesse simplesmente agarrado a primeira ideia que passou por seu pcabeça.

Importante: não se apegue demais a uma hipótese só porque é sua. “Ela é apenas uma estação de passagem na busca pelo conhecimento.” Seja imparcial e compare com as alternativas que surgirem. Por mais que ela pareça uma ideia genial, veja se pode encontrar razões para rejeitá-la. Se você não fizer isso, é certo que outros o farão. E ainda: se há uma cadeia de argumentos, cuide para que todos os elos dessa cadeia funcionem (incluindo a premissa) – e não apenas a maioria deles.

Há vários outros conselhos de Carl Sagan sobre como raciocinar de forma a não aceitarmos todo tipo de “verdade” que nos empurram – e empurram o tempo todo hoje em dia, a cada minuto de nossas vidas “conectadas”. Duvidar é saudável. Afinal, “manter a mente aberta é uma virtude, mas ela não pode ficar tão aberta a ponto de o cérebro cair pra fora”.

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