O título desta crônica encima o capítulo 3 do livro de Eclesiastes. Ali se lê que para tudo na vida há um tempo: tempo para nascer e tempo para morrer; tempo para plantar e tempo para colher; tempo para chorar e tempo para sorrir. Todas as coisas têm o sabor e o sentido do seu tempo.
Esta reflexão me surgiu ouvindo as músicas natalinas. Tocadas fora do seu tempo, não alcançam nossa sensibilidade da forma como ouvidas agora. Revestem o clima com sua ternura, seu mágico poder de nos remeter a tantos natais que já vivemos. E, se não nos tocam mais, cabe a pergunta de Machado de Assis em seu “Soneto de Natal”: mudaria o Natal ou mudei eu?
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Lendo O retrato, segunda parte da magnífica obra O tempo e o vento, de Erico Verissimo, encontrei duas frases que me chamaram a atenção: “Como sabe mal o fumo quando a gente está em jejum” e “Afinal de contas até Bach lhe sabia bem aquela noite”. Estranhei o uso do verbo saber, fiquei desafiado. No dicionário, constam duas dezenas de definições. Uma das últimas diz que saber a significa ter o sabor de.
Tivesse ficado atento, teria visto no início do verbete que saber vem do latim sapere, ter gosto, ter sabor.
Dito isso, ouso dizer quer o Natal me sabe bem, suas músicas, seus corais, o pinheirinho, o presépio, as luzes, as bolachas, que neste ano enfatizaram o saber dos ancestrais, o encontro da família, as celebrações religiosas. Cabe respeitar quem pouco se importa com esse cenário de dezembro, o qual não se impõe, mas se oferece a quem deseja vivê-lo nas exterioridades, ou numa partilha comunitária, ou no convívio familiar, ou ainda no seu silêncio interior.
Não gosto do dezembro nervoso, pleno de correrias, de estresse, de promessas e votos fugazes e inviáveis. A cidade toma um ritmo avassalador, o trânsito se torna caótico, há atropelos para onde se possa olhar. Parece que tudo que se deixou de fazer ao longo do ano precisa ser resolvido agora. O tumulto é tão agressivo, que, chegado o dia da festa, o cansaço tende a gerar um compreensível vazio. Lembra um pouco a história do cachorro que corre atrás de um carro e, quando o alcança, não sabe o que fazer.
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Ao observarmos a lógica da natureza e da vida em geral, notamos que para tudo há um tempo. Pinhão vai bem no inverno, melancia vai bem no verão, bergamota vai bem em qualquer estação, no entanto saboreada ao sol do outono tem gosto especial. Feijoada e mocotó têm morada perfeita no tempo frio. Panetone reina agora, mas desaparece a seguir.
Cada coisa, portanto, cada sentimento, cada vivência tem seu tempo, que ele mesmo atropela, dá por encerrado e aponta para o que vem depois, num constante findar e recomeçar. O final de um ano remete a balanço, a olhar para trás. E o início de um novo ano, para muitos revestido de verde, de esperança, nos permite acalentar sonhos, delinear projetos e até crer numa humanidade sem ódio, mais justa e mais fraterna.
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Como esta é minha última coluna do ano, quero agradecer a todos que me deram a alegria e a honra de ler meus escritos. E desejar a todos um feliz Natal e um suave e abençoado novo ano!
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