Não tenho mais dúvida. A cada dia que passa, me convenço que somos mais torcedores, movidos por paixões de toda ordem – e paixões cegam, todos sabemos! – do que seres racionais que se orientam e agem com base em valores, em princípios que construímos e adotamos para a vida.
Sempre foi assim! – haverá quem diga. Pode ser. Talvez seja a excessiva exposição em redes sociais de comportamentos que antes ficavam restritos a um pequeno círculo social ou à intimidade do grupo familiar que está desvendando a verdadeira face e identidade moral das pessoas.
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Você lembra: – “Não meça a minha honra com a sua régua!” – ouvíamos frequentemente oradores, adversários em qualquer campo, esbravejarem contra seus oponentes. Recurso retórico ou mais que isso, a afirmação subentende que além de regras morais comuns em uma sociedade, as pessoas adotam um código de conduta individual que orienta a forma de ser e agir com base na educação, no caráter, nas experiências de vida de cada um.
A régua moral é, ou pelo menos deveria ser, o que hoje se poderia denominar de QR Code ético de uma pessoa, nossa identidade, porque somos únicos. Na prática, não parece mais ser assim. É como se a configuração individual de cada pessoa estivesse embaçada, embaralhada, indefinida, que já não se deixa decodificar.
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Por conta disso, a régua moral está cada vez mais relativizada e seletiva. A métrica outrora tão definida está rasurada e, o que antes se combatia, agora se defende. E vice-versa. Sem qualquer constrangimento, porque o interesse do momento se sobrepõe a princípios e valores.
Não é só na política ou na ideologia. É no mundo corporativo, no esporte, nas crenças, na forma como nos relacionamos na sociedade. No trânsito, por exemplo. Quando alguém ou uma circunstância nos favorece, quando nos agrada e sintoniza com nossas convicções, perdoa-se os mais horríveis erros, crimes, ilícitos de toda ordem e permitimos a nós mesmos transgressões de que nos deveríamos envergonhar. Mas contra quem está do outro lado, nos constituímos em censores cruéis, juízes implacáveis, mesmo que seus comportamentos não se distanciem do que apreciamos como virtudes. Mas eles estão do lado de lá. Danem-se!
Não pode ser assim. Um mínimo de racionalidade nos mostrará que a vida, nossas escolhas e atitudes, não se sustentam sobre alicerces subjetivos ou interesses de ocasião. Nossa régua moral não pode medir de acordo com o que nos convém, nem se encolher e derreter feito gelatina diante do que não apreciamos.
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Em passado já distante, durante uma aula no curso de Direito, o professor nos colocou à frente de um dilema e desafiou: – “Defendam uma tese para resolver o problema. Se não acharem a solução, pelo menos não se afastem da lógica e da coerência, porque é isso que a vida vai cobrar de vocês”.
Mais atual do que nunca: não basta ter uma régua moral. É preciso ser coerente e enquadrar nossas atitudes e escolhas dentro da sua métrica e não de conveniências do momento. O resto é hipocrisia.
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