Rádios ao vivo

Leia a Gazeta Digital

Publicidade

HISTÓRIA

Como foi o começo da colonização de Sinimbu

Fotografia antiga mostra uma vila ainda muito pequena, mas já era possível ver a Igreja Católica ao fundo e o atual prédio da Cacis ao centro

Depois de falar, na semana passada, sobre o início da urbanização de Santa Cruz do Sul, é fundamental abordar também como se desenvolveram as colônias, que posteriormente se tornaram distritos e, mais recentemente, municípios do entorno. É o caso de Sinimbu, cuja colonização começou apenas três anos depois, em 1852, quando o primeiro imigrante daquela região, João Backes, recebeu o primeiro lote. Em 1878, por intermédio de Carlos Trein Filho, novos lotes foram demarcados e cedidos aos interessados. Mais tarde, em 1905, após a movimentação dos moradores, passou a ser um distrito.

De lá para cá, assim como ocorreu em todas as colônias, Sinimbu criou uma vila para ser a sede do distrito e ponto de comércio e encontro da comunidade. Com o passar dos anos, a vila cresceu até se tornar cidade, com a emancipação político-administrativa de Santa Cruz, conquistada em 1992. Apesar do crescimento, Sinimbu permanece com a grande maioria da população vivendo na zona rural, distribuída nas quase 30 localidades espalhadas pelo vasto interior.

LEIA TAMBÉM: Furna das extinções

Publicidade

A origem e os primeiros colonizadores

Diferentemente de Santa Cruz do Sul, em que há farta documentação sobre o início do processo de colonização, primeiros imigrantes, localidades e muitas outras informações, a história de Sinimbu não foi documentada da mesma maneira. Assim, para compreender a evolução do município é preciso recorrer a diferentes registros de igrejas, empresas, impressos antigos ou relatos dos descendentes. Um deles é Fernando Hennig, proprietário da Kaffeehaus e bisneto de Augusto Hennig, conhecido como Barão do Tabaco e um dos grandes responsáveis pelo desenvolvimento do distrito.

Além da cafeteria, Fernando mora na casa que pertence à família há mais de um século e mantém um grande acervo de antiguidades em um depósito de tabaco desativado, localizado ao lado do trevo de entrada de Sinimbu. Ele reconhece o empenho de outros descendentes e pessoas que adquiriram propriedades antigas e se esforçaram para preservar casas, galpões e utensílios, mas se queixa da falta de apoio do poder público e da própria comunidade na preservação da memória e da história.

A falta de fontes confiáveis causa confusões que chegam até mesmo ao nome do município. Uma das versões diz que se tratava de uma ave muito comum no século 19, quando chegaram os primeiros imigrantes. Essa teoria, contudo, esbarra na ausência de registros, relatos de pessoas e da própria ave, que não tem exemplares nos dias atuais nem é documentada.

Publicidade

LEIA TAMBÉM: Nápoles: A cidade e seu magnífico entorno

Outra possibilidade é que seria o nome de um indígena que habitava a região. Novamente, não há nenhum registro, e a existência de povos indígenas naquela região foi descartada por Afonso Pedro Mabilde, então diretor da colônia. Em carta ao presidente da Província, ele negou com veemência a ocupação de indígenas, com exceção de algumas tribos que eventualmente passavam pelas terras do alto da serra.

A versão mais aceita é que o nome foi uma homenagem a João Lins Vieira Cansanção de Sinimbu, o Visconde de Sinimbu. Presidente da Província de São Pedro do Rio Grande do Sul, ele foi um grande incentivador da colonização por imigrantes germânicos e determinou a criação das colônias de Sinimbu, São João da Serra e Dona Josefa, entre outras. Presidiu ainda as províncias de Alagoas e Sergipe, além de ter ocupado outros cargos no governo imperial. Não há registros precisos sobre sua morte, mas relatos da época dão conta de que ele foi atingido em cheio pela Proclamação da República e morreu na pobreza em 1906, aos 96 anos.

Publicidade

A grande enchente de 1919

Há 105 anos, em 1919, o então 4º distrito de Santa Cruz do Sul foi afetado por uma enchente semelhante à ocorrida em 2024. No arquivo de Fernando Hennig, reportagens do jornal Kolonie davam a dimensão do tamanho da tragédia.

De acordo com a publicação, a chuva começou na manhã de 22 de novembro. O grande volume de água não tardou a provocar grandes prejuízos a residências, propriedades rurais e vidas: foram três pessoas mortas e centenas de animais mortos ou desaparecidos na enxurrada. A força das águas levou embora árvores, casas e galpões.

Além de Sinimbu, na sede e no interior, Rio Pardinho, Vera Cruz e Santa Cruz do Sul foram atingidas. Esta última com menos intensidade, uma vez que o atual Bairro Várzea ainda não existia e o Rio Pardinho tinha amplo espaço para espraiar-se. Os moradores da vila de Sinimbu subiram para a parte mais alta, perto do hospital, ou buscaram abrigo nos sótãos das casas. Ao contrário de hoje, em que há apoio dos governos, naquela época a reconstrução foi custosa e lenta devido à falta de recursos.

Publicidade

LEIA TAMBÉM: Luis Rocha lança primeiro romance

Uma semana depois, o redator do Kolonie voltou ao distrito para relatar o drama das famílias que sofreram com as perdas. Nas barrancas do Rio Pardinho, o cenário era semelhante ao atual: elas foram levadas pela água e restaram poucas árvores de pé.

Estradas foram destruídas, acessos desapareceram e as pontes pênseis, muito usadas para os deslocamentos, estavam rompidas ou também haviam sumido. A Igreja Nossa Senhora da Glória foi alagada e sofreu danos extensos, o que levou os moradores a construírem um novo templo.

Publicidade

Igrejas são uma marca do município

Em 2021 o arquiteto, professor e escritor Ronaldo Wink publicou uma pesquisa sobre a construção da Igreja Católica Nossa Senhora da Glória e da Igreja Luterana. O primeiro templo evangélico foi erguido em 1875, no interior, enquanto o católico foi construído em 1878 e servia também como escola.
No fim do século 19, a comunidade se uniu para a construção de um novo prédio que seria usado somente como igreja. Tratava-se de uma edificação simples, com torre, presbitério e sacristia, muito menos detalhada que a atual.

Antiga igreja católica era mais simples que a atual. Ao lado do templo, como é tradição, ficava a escola

Após a enchente de 1919, em que a igreja foi alagada, começaram as conversas para levantar uma nova. A ideia, contudo, só ganhou corpo em 1925, quando houve votação entre os associados.

O encontro definiu ainda o local – ao lado da existente – e também o estilo arquitetônico. O neogótico, ainda que já estivesse em desuso na Europa, foi escolhido, pois os imigrantes lembraram das grandes catedrais alemãs, como as existentes em Colônia, Ulm e Freiburg.

LEIA TAMBÉM: Ruy Castro: o mestre da biografia

Os arquitetos Ernst Seubert e Simon Gramlich foram escolhidos para elaborar os projetos. O primeiro optou por um estilo eclético, enquanto o segundo, que também estava em negociações para projetar a Catedral São João Batista, em Santa Cruz, trouxe o neogótico e foi o escolhido. O templo impressiona pelo detalhamento e verticalidade: a torre tem 51 metros de altura e a construção, os mesmos 51 metros de comprimento e 25 metros de largura. As obras começaram em 1927 e foram concluídas em 1932.

Nesse mesmo período, os luteranos debatiam a reforma do antigo templo, no interior, ou a criação de um novo, na vila. A aprovação da compra do terreno ocorreu em 1938, quando Otto Hermann Menchen foi escolhido para elaborar o projeto arquitetônico. A pedra fundamental foi lançada em 1939. A construção do templo ocorreu durante a Segunda Guerra Mundial, uma época muito complicada para os imigrantes e seus descendentes. A inauguração foi dez anos depois, em 1949, tendo Gustaf Engelbrecht como primeiro pastor.

Quem foi Sinimbu

João Lins Vieira Cansanção de Sinimbu nasceu em São Miguel dos Campos, na então capitania de Pernambuco e atual Estado de Alagoas, em 1810. Bacharel em Direito pela Academia Jurídica de Olinda, no começo da vida adulta foi morar na Europa em busca de aperfeiçoamento na formação. Estudou em Paris e em Jena, na Alemanha, onde obteve o título de doutor. Retornando ao Brasil, aos 30 anos foi nomeado presidente da província de Sergipe.

Político foi relevante durante o império

LEIA TAMBÉM: Concurso elege rainha Afro Estudantil da rede municipal de Santa Cruz

Depois, foi nomeado presidente da província de São Pedro do Rio Grande do Sul, em 1852, três anos depois da fundação da colônia de Santa Cruz e no ano em que os primeiros lotes da atual Sinimbu começaram a ser ocupados. Foi um grande incentivador da colonização por imigrantes germânicos e autorizou a fundação de diversas colônias enquanto gestor, até 1855. Depois foi nomeado presidente da província da Bahia, onde permaneceu entre 1856 e 1858. Ocupou ainda cargos de primeiro escalão no governo imperial, como ministro da Agricultura, Comércio e Obras Públicas.

Seu último cargo foi a presidência da Província de Alagoas, ocupada por ele até a Proclamação da República, em 1889. Monarquista convicto, o político tinha receio de que o Brasil acabasse fragmentado em várias pequenas repúblicas – o que não se confirmou.

Sinimbu não fazia parte do nome de batismo, que era João Lins Vieira. Cansanção é uma planta nativa da caatinga, enquanto Sinimbu é a localidade onde ele nasceu. Faleceu em 1906, aos 96 anos, no Rio de Janeiro. Depois de ter perdido os títulos e posses com o fim da monarquia, viveu seus últimos dias na pobreza, sobrevivendo da venda de livros, joias e condecorações.

LEIA MAIS DE CULTURA E LAZER

Aviso de cookies

Nós utilizamos cookies e outras tecnologias semelhantes para melhorar sua experiência em nossos serviços, personalizar publicidade e recomendar conteúdos de seu interesse. Para saber mais, consulte a nossa Política de Privacidade.