A investigação do caso que marcou o ano em Santa Cruz do Sul está concluída. Nessa quarta-feira, 9, à noite, a delegada Raquel Schneider remeteu ao Poder Judiciário o inquérito sobre a apuração que identificou um esquema de desvios de verbas, doações e cestas básicas da Associação de Auxílio aos Necessitados (Asan). Os detalhes foram desdobrados em três volumes de evidências, que agora vão ser analisadas pelo promotor Gustavo Burgos de Oliveira e pela juíza Márcia Inês Doebber Wrasse.
Em entrevista exclusiva à Gazeta do Sul nessa quarta-feira, a delegada Raquel revelou bastidores da apuração. Entre eles, que mais de R$ 1 milhão foi desviado entre os anos de 2020 e 2024 do lar de idosos, que conta com 75 residentes e fica na Rua Padre Luiz Müller, no Bairro Bom Jesus. Ao todo, 14 pessoas foram indiciadas pela Polícia Civil, cada uma de acordo com a sua participação, das quais 12 residem em Santa Cruz e duas em Vera Cruz.
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Os delitos imputados pela Polícia Civil foram associação criminosa, lavagem de dinheiro, estelionato, falsidade ideológica, apropriação indébita de bens de pessoa idosa, emissão de nota fiscal falsa e falsa identidade. Ao longo da investigação, 59 pessoas foram ouvidas. “Algumas pessoas que prestaram depoimento e figuravam como testemunhas até bem pouco tempo foram identificadas com algum tipo de envolvimento e acabaram sendo indiciadas”, detalhou Raquel.
Além dos depoimentos, a polícia apurou provas a partir de quebras de sigilo e imagens de câmeras. “Ainda vão ficar pendentes algumas perícias que estamos aguardando. Foi uma investigação bem marcante e trabalhosa. É um caso que chama bastante a atenção, principalmente porque atinge essas pessoas vulneráveis, que precisam tanto de apoio e cuidado. Em vez disso, existiam pessoas se aproveitando”, complementou a chefe do Cartório do Idoso.
Principal investigado é preso duas vezes
Preso preventivamente desde o dia 30 de setembro no Presídio Regional de Santa Cruz do Sul, Marco Antonio Almeida de Moraes, 49 anos, é apontado pela Polícia Civil como chefe do grupo criminoso. Ele era vice-presidente do Conselho Municipal do Idoso e administrador do lar de idosos. Conforme a investigação, entrou na Asan para prestar serviços comunitários, cumprindo uma pena de sentença condenatória transitada em julgado na Justiça Federal.
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Após finalizar essa pena, teria passado a ser o administrador. A partir de então, funcionários começaram a suspeitar do desvio de doações e de que havia superfaturamento de notas fiscais. Muitas pessoas queriam denunciar as situações que viam no local. Entre os pontos inusitados apurados está que o coordenador do espaço teria dito que seria amigo de uma promotora, o que era mentira.
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Porém, isso fazia com que muitos funcionários e servidores da Asan não procurassem o Ministério Público, pois tinham receio de que as informações não ficassem em sigilo e chegassem até Marco Antonio. O caso começou a ser analisado pelo Cartório do Idoso em 3 de julho, quando o Ministério Público fez uma requisição à Polícia Civil, solicitando investigação de informações de desvios após denúncias feitas por pessoas da comunidade.
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Durante um mês e meio, os agentes, chefiados pela delegada Raquel, checaram informações e apuraram indícios de que, de fato, irregularidades poderiam estar acontecendo. Em cerca de três meses, os policiais se debruçaram na busca por evidências. Após apurar provas, organizou-se uma primeira ofensiva em 19 de agosto, quando sete mandados de busca e apreensão foram cumpridos. Um oficial de Justiça interditou o local e determinou o afastamento de uma primeira leva de servidores suspeitos.
Marco Antonio Almeida de Moraes foi preso em flagrante por posse irregular de arma de fogo de uso permitido, em sua residência, na Rua Tiradentes, Bairro Goiás. Ele portava um revólver calibre 38 que era de uma empresa de vigilância de São Paulo e constava como perdido no sistema policial. Levado à delegacia, prestou esclarecimentos e foi liberado após pagar fiança de dez salários mínimos, no valor total de R$ 14.120,00.
Veículo apreendido para ressarcimento
Três dias depois da primeira ofensiva, no dia 22 de agosto, a Polícia Civil apreendeu um veículo de Marco Antonio Almeida de Moraes. A SUV Fiat Freemont branca, ano 2012, com valor estimado em R$ 45 mil, foi alvo de um sequestro judicial para ficar em uso provisório da Asan enquanto tramita a investigação. E também para garantir um eventual ressarcimento da entidade ao final do processo, caso sejam comprovados os desvios de verbas.
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Após análise nos materiais e mídias apreendidas na primeira ofensiva, a Polícia Civil e uma oficial de Justiça cumpriram nova ação na Asan, em 17 de setembro, desta vez para afastar mais uma servidora envolvida no esquema. A derradeira operação aconteceu no dia 30 de setembro, quando Marco Antonio Almeida de Moraes foi preso preventivamente.
Segundo o que a delegada Raquel disse na oportunidade, o homem estaria atrapalhando o andamento da investigação. Estaria interferindo em depoimentos e em contato com testemunhas que eram suas funcionárias e tiveram empresas no modelo Microempreendedor Individual (MEI) criadas em seus nomes, para que fossem expedidas notas fraudulentas.
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