No Brasil, é possível que jamais tenha se falado tanto sobre um país vizinho. Infelizmente, diante da improdutiva polarização política, o que se ouve e lê contém quase sempre uma pitada de má-fé e, frequentemente, doses cavalares de ignorância sobre a história e as raízes das tradições e dos problemas da Venezuela.
Antigo palco de conflitos indígenas entre aruaques e caribes, o território venezuelano foi a primeira região continental das Américas na qual Colombo colocou os pés, em 1498, em sua quarta expedição. No ano seguinte, Américo Vespúcio chegou à região.
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O italiano gostava de designar locais – logo eternizaria seu nome no continente inteiro – e ficou impressionado com as aldeias indígenas de palafitas na região do Lago Maracaibo. Como referência ao seu país natal, Américo as comparou com Veneza, chamando a região de Veneziola (pequena Veneza). Na versão espanhola, Venezuela.
Sob a liderança de um nativo da capital venezuelana Caracas, o revolucionário Simón Bolívar (ver box à direita), o país foi uma das primeiras colônias espanholas a declarar independência, em 1811, como parte da Grã-Colômbia (atuais Equador, Colômbia, Venezuela e Panamá). A instabilidade política foi a norma do século pós-independência, com dezenas de golpes, revoltas e desavenças ideológicas.
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A situação melhorou sob a presidência de Juan Vicente Gómez (1857-1935), menos pelas qualidades do ditador e mais por um achado que mudaria a vida da nação: o petróleo. A descoberta da maior reserva conhecida do planeta se deu na bela região de Maracaibo, em 1918. Os hidrocarbonetos se tornariam fonte de vasta riqueza econômica e de frequente turbulência política.
Nos anos seguintes, enormes investimentos em infraestrutura pública e diminuição da pobreza fizeram com que o povo tapasse um olho para a repressão política de Gomez. A maior parte dos benefícios, é claro, ficavam para a elite venezuelana e para seus convidados especiais, as corporações norte-americanas que exploravam o ouro negro.
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Seguiram-se regimes totalitários e truculentos de extrema-direita, sustentados pelos militares, até 1974, quando o presidente Carlos Andrés Pérez trouxe relativa democratização ao país e nacionalizou a exploração de petróleo. O período que se seguiu, conhecido como “Venezuela Saudita”, fez com que o país se tornasse, com folga, a nação mais rica da América Latina.
Outras nações com abundantes petrodólares, como Noruega e países árabes, souberam reduzir a dependência dos petrodólares, diversificando a economia e criando reservas para períodos de vacas magras. A Venezuela jamais aprendeu a lição. No início dos anos 80, quando o preço do petróleo desabou, a economia venezuelana entrou em colapso.
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Em andanças pelo país, pude ver de perto as consequências de décadas de instabilidade econômica e populismo exacerbado de direita e de esquerda, um círculo vicioso que sempre resulta em rebote exacerbado do governo anterior, amplificando continuamente os problemas de sempre.
O Libertador
Simón José Antonio de la Santísima Trinidad Bolívar Palacios Ponte y Blanco, ou Simón Bolívar (1783-1830), é herói nacional de Venezuela, Colômbia, Equador, Peru, Panamá e do país que o homenageou no nome, a Bolívia. O caraquenho, aliás, é a única pessoa presente no nome de duas nações. Desde 1999, seu país natal se chama oficialmente República Bolivariana da Venezuela.
Bolívar nasceu em uma família abastada e perdeu os pais ainda criança. Foi educado na Espanha, onde entrou em contato com ideias iluministas que o inspiraram no firme propósito de libertar as Américas do jugo espanhol. Com o enfraquecimento dos colonizadores, diante das invasões napoleônicas, aproveitou para retornar à América do Sul e deixar seu legado libertador. Bem além da América Latina, estátuas homenageiam o venezuelano em locais como Londres, Washington, Berlim e Nova York. Somente nos EUA, 14 cidades levam seu nome.
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Em 1822, Simón se apaixonou pela equatoriana Manuela Saenz, na época era casada com o médico inglês James Thorne e parte da luxuosa aristocracia peruana. O ímpeto revolucionário de ambos tornou o sentimento ainda mais arrebatador. Ao unir-se a Bolívar, Manuela escreveu uma carta ao ex-marido: “Deixa-me em paz. Que monotonia está reservada para tua nação, que (como tu) ama sem prazer, conversa sem sorrir, caminha sem pressa, senta-se com cautela e não ri das próprias piadas.”
Considerando a aventura que o casal viveria na América Latina, as pungentes palavras são de certa forma compreensíveis.
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