Ao entrar no imenso saguão da Estação Central de Zurique, pensei em dois antigos residentes da cidade e no simbolismo histórico daquele local. Em 1896, desembarcava ali um dos maiores cientistas de todos os tempos, que transformaria a Física teórica e vários conceitos universais. Pouco mais de duas décadas depois, partia da mesma estação ferroviária outro revolucionário, determinado a liderar uma das maiores transformações políticas da história mundial.
A belíssima cidade, fundada pelos romanos como Turicum, ocupa as margens do Rio Limmat e do imenso Lago Zurique. Mais do que relógios, chocolates, bancos e seguradoras, base da vigorosa economia da metrópole mais populosa do país, meu maior interesse era conhecer o ambiente histórico e cultural onde nasceram e viveram personalidades marcantes, como o polêmico compositor Richard Wagner, o fascinante psiquiatra Carl Jung, o escritor James Joyce e os dois revolucionários – cada um a seu modo – mencionados no parágrafo anterior.
LEIA TAMBÉM: Pelo mundo: Jordânia, a região que transcende o tempo
Publicidade
A primeira parada foi no Instituto Federal de Tecnologia, ou ETH (Eidgenössische Technische Hochschule), alma mater de Albert Einstein. A instituição diplomou o físico em 1900 e ainda o teve como professor por vários anos. Por ali, passaram também John von Neumann, Wilhelm Röntgen, Wolfgang Pauli, Wernher von Braun, além de 22 laureados com o prêmio Nobel. No mesmo ano em que chegou à Suíça, Einstein renunciou à cidadania alemã. Posteriormente, tornar-se-ia cidadão suíço e estadunidense.
Meu destino seguinte foi o número 14 da estreita viela Spiegelgasse. Naquele endereço, em um diminuto apartamento cuja cozinha era dividida com mais quatro famílias, morou o casal Vladimir Ulyanov e Nadejda Krupskaya. A mente revolucionária do russo que entraria para história como Vladimir Lenin foi influenciada pelo ambiente dos sindicatos ou guildas (Zünfte) de Zurique, tradicionais e fortes desde o século 14 até os dias de hoje. Lenin discursava para os trabalhadores suíços, na sua grande maioria famintos e vivendo em péssimas condições. Na cidade, ele escreveu a obra “Imperialismo, o mais alto estágio do capitalismo”.
LEIA TAMBÉM: Pelo mundo: uma das grandes maravilhas da Escandinávia
Publicidade
Assim que o czar Nicolau II abdicou do trono, o russo quis retornar à terra natal. Em abril de 1917, Lenin e a esposa partiram de Zurique em um trem especial, fretado pelo governo alemão, que atravessou o Segundo Reich em guerra, a Suécia e a Finlândia para chegar na turbulenta São Petersburgo. Pouco tempo depois, o secreto passageiro lideraria a revolução bolchevique, que culminou na criação da União Soviética. Independentemente de admirar ou abominar suas ideias, Lenin é uma figura histórica marcante.
Cito ainda Carlos Magno, que, segundo uma lenda local, teria mandado construir Grossmünster, igreja com duas altas torres que se destaca na silhueta de Zurique. Uma antiga estátua do rei dos francos pode ser vista na cripta do templo, no local onde seu cavalo teria se prostrado diante das tumbas de Félix, Régula e Exuperantius, santos padroeiros de Zurique. Antiga catedral católica, Grossmünster foi convertida em 1520 ao protestantismo por obra do reformador Huldrych Zwingli, um nativo da cidade.
Pensando no legado de Einstein, Lenin e outros reles humanos, pareceu-me que, por vezes, obras podem ser infinitamente maiores que seus autores. O bem que fazemos aos outros, por exemplo, sugere ser bem maior do que somos, sendo resultado de um esforço coletivo ou de alguma inspiração além do nosso entendimento. A ousadia de se entregar a um propósito superior pode dar à vida humana, curta e vulgar, alguma chance de dignidade e plenitude.
Publicidade
Chegou a newsletter do Gaz! 🤩 Tudo que você precisa saber direto no seu e-mail. Conteúdo exclusivo e confiável sobre Santa Cruz e região. É gratuito. Inscreva-se agora no link » cutt.ly/newsletter-do-Gaz 💙
Publicidade