“Padre! A igreja vai cair!” É isso que o pároco José Inácio Straatmann, hoje com 76 anos, ouviu dos fiéis em fevereiro de 2015, quando retornou para Passo do Sobrado com o objetivo de reassumir a paróquia local. Uma das mais belas construções neogóticas do arquiteto alemão Simon Gramlich – o mesmo que coordenou as obras da Catedral São João Batista e das igrejas de Sinimbu e Venâncio Aires –, a Igreja Nossa Senhora do Rosário, fundada em 1939, estava na iminência de ruir.
“O telhado tinha descido dez centímetros. O amadeiramento estava podre, corroído pela infiltração da umidade. Então, em caráter emergencial, empurramos a estrutura para cima, tiramos umas partes estragadas e apoiamos o canto”, contou o padre. E foi naquele momento que ele decidiu: a comunidade precisava se unir para restaurar o templo. Mas não seria fácil.
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Os poderes Executivo e Legislativo de Passo do Sobrado não se mostraram à vontade para colaborar com recursos. Foi então que Straatmann juntou um grupo de voluntários que começaria um trabalho de formiguinha, aos poucos, na busca por recuperar a igreja, que teve sua construção iniciada em 1927. E foi o que aconteceu nos últimos anos, em uma força voluntária praticamente anônima, sem nenhum reconhecimento.
Um novo telhado, bancos, sistema de som, drenagem, pintura externa e interna, recuperação das imagens de santos, calçamento e paisagismo foram algumas das ações executadas ao longo dos anos. Agora, no dia 31 de março, na missa de Páscoa, uma nova iluminação externa foi inaugurada. Isso chamou a atenção de quem passava pela frente da igreja, que mal sabia de todo o movimento voluntário feito para recuperar a estrutura.
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Sem reconhecimento
As ações do grupo, no entanto, não passaram despercebidas pelos olhos da moradora Maria Ione da Rosa, de 69 anos. Professora aposentada, ela via da janela de casa o movimento dos envolvidos na obra, seja para conseguir os recursos ou mesmo para colocar a mão na massa. Nesse fim de semana, ela chamou a reportagem da Gazeta do Sul para registrar o trabalho e tirar o grupo do anonimato.
“É um trabalho muito bonito que eles fizeram. Sou daqui, mas depois que casei fui embora. Retornei mais tarde para cuidar da minha mãe e do meu irmão, e fui assistindo aos poucos à sequência da obra. Esse grupo merece reconhecimento, algo que nunca veio, nem sequer em uma menção na Câmara de Vereadores parabenizando-os”, disse Maria Ione.
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Morte de produtor e pandemia atrapalharam restauração
Um dos primeiros a serem chamados para ajudar na obra, o empresário Valmor Lersch, de 57 anos, lembra das dificuldades do início. “Compramos as telhas, que custaram R$ 43 mil, mas precisamos deixá-las guardadas dois anos, para quando tivéssemos condições financeiras de instalá-las”, detalhou. Diferentemente do que havia no local, quando o telhado foi trocado, o material novo era mais reforçado, com telha gravilhada.
Nos primeiros cinco anos da revitalização da igreja, muitos movimentos foram realizados; entretanto, duas situações complicaram a sequência. A primeira foi o assassinato a tiros do promotor de eventos Joangelo Martin, o Jô, de 32 anos, em 27 de março de 2016.
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Amigo pessoal do grupo, ele era responsável por organizar muitos eventos no Salão Paroquial, o que gerava uma renda de aluguel que era transferida para o fundo de restauração. Com a falta de eventos, o incremento de dinheiro diminuiu. Além disso, os dois anos de pandemia também tiveram reflexos na movimentação de pessoas. Não apenas na parada da obra, mas porque alguns membros do grupo decidiram sair. Nada que fizesse os que ficaram desanimar.
Conforme outro dos voluntários, Luiz Paulo Jacobsen, de 66 anos, o grande incremento de recursos para alavancar a obra aconteceu a partir de um empréstimo de R$ 100 mil obtido junto à Mitra Diocesana. “Também fomos autorizados a vender terrenos baldios junto à igreja, que eram da Mitra, para que conseguíssemos dar sequência aos trabalhos”, disse o comerciante aposentado.
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Muito dinheiro está “embaixo da terra”
Segundo Luiz Paulo Jacobsen, parte de todo o recurso empregado na obra de restauração está embaixo da terra. “O grande problema era a umidade. A drenagem foi uma das coisas mais importantes. Quando chovia, a infiltração era muito grande. As colunas se deterioravam, estragava muita coisa e a água ficava dias parada ali”, disse ele.
“Usamos tubos especiais e todo o esgoto pluvial foi canalizado, encerrando esse problema”, disse Jacobsen, que era dono de um mercado no centro da cidade. A restauração permitiu também a readequação dos espaços. A sala da sacristia foi remodelada: passou a contar com forro de gesso e piso em vez de assoalho de madeira.
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As portas foram totalmente restauradas. E uma repartição que servia para guardar imagens estragadas e lustres antigos virou sala de catequese para as crianças. “A parte da pavimentação na frente também foi muito complicada, pela movimentação de máquinas que gerou na época”, relembrou Giselda Kroth, de 54 anos, secretária da paróquia, que guarda fotos do período. Os bancos da igreja também foram estofados. O custo total da restauração se aproximou de R$ 1 milhão.
O passo agora é buscar recursos para a restauração da casa paroquial. “A união e dedicação deles ficarão na história. Será um legado deixado para a cidade”, comentou Maria Ione. Hoje, olhando para trás, o padre José Inácio Straatmann se emociona. “Foi amor à camiseta desse grupo, que começou há quase dez anos e investiu tempo e dinheiro. Eles merecem reconhecimento.”
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