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LUÍS FERNANDO FERREIRA

Algo que não quer morrer

Em um de seus livros, Ray Bradbury, autor de Fahrenheit 451, lembra a conversa que teve com o garçom de um restaurante em Paris, nos arredores da Torre Eiffel. O empregado lhe contou sua rotina de trabalho, com jornadas diárias de 10 a 14 horas, e o que ele fazia para compensar esse tempo no serviço.

Após o expediente, por volta da meia-noite o garçom sai para dançar, até umas quatro ou cinco da madrugada. Então dorme algumas poucas horas, e a faina recomeça. O mesmo ritmo todos os dias. Bradbury se impressiona e pergunta: como ele consegue?

“Fácil”, responde. “Dormir é como estar morto. Então dançamos. Dançamos para não estarmos mortos. Não queremos isso.”

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O diálogo continua. E o que o famoso escritor costuma fazer nas madrugadas? Ele escreve, naturalmente, e por igual razão. “Para não estar morto.” Todas as histórias fantásticas que Ray Bradbury concebeu em seus 91 anos (1920-2012) fazem parte desse esforço para viver. Não se pode dizer que tenha sido malsucedido.

Assista à série Black Mirror, por exemplo, e verá a influência dos contos de Bradbury. Num deles, “O Homem Ilustrado”, o corpo do protagonista é coberto de tatuagens que não podem ser removidas, e que retratam figuras e situações estranhas. A certa hora da noite, as tattoos começam a se movimentar e ganham vida sobre a pele do Homem Ilustrado. E histórias se desenrolam diante de quem as observa.

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Histórias. Cada um tem as próprias, ainda que não estampadas na carne. Em algum lugar estará o ponto final; até lá, continuamos escrevendo. “Viver é continuamente afastar de si algo que quer morrer”, diz Nietzsche em A gaia ciência. Pois os degraus da escadaria tornam-se descendentes muito rápido, e cada um tem sua maneira de lidar com isso.

Aos 83 anos, Hayao Miyazaki tem a sua maneira de não morrer: ele cria novos mundos para ampliar este. O Menino e a Garça, vencedor do Oscar de melhor animação, é considerado um dos melhores filmes desse cineasta japonês. A jornada de um garoto à procura da mãe (morta na guerra) em um universo paralelo é surreal, enigmática e emocionante.

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Criar é ultrapassar o fim.

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