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Entrevista

“Só pensava em sobreviver, pelos meus filhos”, diz homem baleado por PM

Foto: Cristiano Silva

Acompanhado da esposa Stefany, Anderson revelou detalhes sobre o que aconteceu

Baleado em pontos do corpo, caído ao chão e sangrando, Anderson Micael Pereira Padilha, de 26 anos, rezava para o atendimento médico chegar. “Só pensava em sobreviver, pelos meus filhos. Tinha que aguentar mais um pouco, por eles.” O rapaz, pai de dois meninos de 2 e 5 anos, foi um dos dois homens alvejados por disparos de arma de fogo efetuados por um policial militar, na noite de 8 de dezembro de 2023, sexta-feira, durante o patrulhamento de uma guarnição da Força Tática na Rua Guilherme Kuhn, Bairro Belvedere, em Santa Cruz do Sul.

O caso, que gerou repercussão em nível estadual, completou um mês na última segunda-feira e segue em investigação com dois inquéritos em andamento de forma paralela, um com a Brigada Militar e outro com a Polícia Civil. Após passar por um período internado, Anderson saiu do Hospital Santa Cruz e concedeu uma entrevista exclusiva à Gazeta do Sul, onde relembrou detalhes da ocorrência.

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Bastante debilitado, ainda com sequelas, o rapaz, que trabalha desde os 17 anos como operador em uma distribuidora de produtos alimentícios em Linha João Alves, mostrou as marcas dos tiros. Um projétil permanece alojado e outro foi retirado em cirurgia. Na mesma ocorrência, João Omar Lenz, de 44 anos, conhecido pelo apelido de Zé, morreu após ser atingido com quatro tiros, no umbigo, lateral do corpo e costas.

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Segundo Anderson, no dia do fato, sua mãe havia lhe pedido para ir à casa de João, que fica perto, e lhe solicitar um serviço de mudança em sua residência. “Cheguei, falei com o neto dele, que entrou no meu carro, depois fui lá dentro e, enquanto ele estava arrumando as ferramentas para ir lá em casa, escutei uma voz de abordagem. Olhei para o lado e já comecei a tomar os tiros”, disse Anderson.

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O primeiro acertou na mão dele, depois disparos acertaram as costas. “Olhei e me apavorei. Caí no chão. Só chamava os nomes dos meus filhos, achei que ia morrer, não acreditava no que estava acontecendo. Só sentia um negócio escorrendo, uma sensação muito ruim.” Conforme o rapaz, apenas um policial militar atirou nele e em João Omar.

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“O Zé gritou e a gente começou a pedir ajuda. Eu não conseguia me mexer, as pernas ficaram retorcidas e eu fiquei tentando mexer os pés, e quase não sentia. Achei que um tiro tinha pegado na coluna”, disse Anderson. Segundo a família, por pouco o rapaz não ficou tetraplégico. Diferentemente de João Omar, que foi carregado por PMs com um lençol branco por cima, Anderson foi retirado da casa em uma maca do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu).

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“Na ambulância, eles não deixavam eu dormir. No hospital, eu vi o Zé em uma cama, do meu lado. Depois apaguei e não lembro de mais nada. Fui acordar só no domingo, quando recebi a notícia de que ele tinha falecido”, relatou Anderson. “Me passava um filme na cabeça. Foi bem difícil, acordei bem agitado e lembrava do que tinha acontecido.”

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Família autorizou acesso ao telefone celular

O inquérito da Polícia Civil deve durar ainda de dois a três meses para ser concluído, pois são aguardados laudos periciais, inclusive balísticos, na pistola calibre 9 milímetros do PM que disparou contra os dois. Duas testemunhas devem depor ao longo dos próximos dias. Os policiais militares que atuaram na ocorrência, que já prestaram depoimento na Brigada Militar, ainda devem ser chamados para depor na Polícia Civil.

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Uma solicitação foi para que Anderson autorizasse o acesso ao seu telefone celular. Conforme o advogado da família, Felipe Haas, as senhas serão fornecidas. Segundo ele, alguns estojos sumiram na cena do crime e outros, que caíram em lugares mais escondidos, foram apreendidos e entregues para a Polícia Civil. Um levantamento fotográfico e a apuração de vestígios foram realizados pelo Instituto-Geral de Perícias (IGP) na segunda-feira após o crime.

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Anderson mostrou alguns dos pontos onde foi ferido | Foto: Cristiano Silva

“Não há qualquer objeção ao acesso ao celular, mesmo porque não tem o que esconder. Nesse caso, houve um homicídio e uma tentativa de homicídio. Não temos dúvida de que os policiais militares entraram com outra intenção, não era apenas abordagem, queriam algo a mais”, disse o defensor. Para Anderson, o momento é para descansar e se recuperar. À base de remédios, relata sentir muitas dores onde tomou os tiros, e tem dificuldades para caminhar.

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“Dá umas crises de dor e fisgadas no joelho. Só remédio forte para aguentar. O tiro na bacia ainda vai demorar para cicatrizar.” Questionado sobre o que espera do caso, o rapaz afirma buscar justiça. “Quero também limpar meu nome, pois nunca tive nada a ver com crime. E justiça pelo Zé, porque nada justifica a forma que eles entraram e atiraram em alguém desse jeito. Do jeito que foi, foi para matar os dois.”

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Chamado por outro nome

A versão sustentada pelos policiais militares que atuaram na ocorrência é de que estavam em frente à residência onde mora Lenz, conhecido pelo apelido de Armeiro. Foi quando um PM teria visualizado um homem entrando em um corredor de forma apressada, o que gerou suspeita. Ao se aproximar para efetuar a abordagem, o indivíduo correu, mas foi logo alcançado. Na sequência, João teria sido visto dentro da casa com uma arma de fogo em punho. Junto dele estaria Anderson, também portando uma arma.

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Nesse momento, um PM deu voz de abordagem, que não teria sido acatada. Conforme o policial, os dois que estavam no imóvel teriam feito menção de disparar contra ele e, para neutralizar a ação, respondeu efetuando disparos. “Não teve nada disso de menção, e me acertaram sem nenhum motivo. Ainda me chamavam por outro nome”, disse Anderson.

Em coletiva de imprensa no dia 15 de dezembro, o coronel Giovani Paim Moresco disse que a residência onde estavam os dois baleados já havia sido alvo de outras ações policiais, e tanto João Lenz como Anderson Padilha tinham registros de ocorrências em seus históricos. A família de Anderson contesta e afirma que ele jamais teve envolvimento ou registros policiais em sua ficha. “Quando prestamos depoimento, um policial civil mesmo disse que ele não tinha nada na ficha”, contou a esposa de Anderson, Stefany Machado, de 23 anos, que acompanhou a entrevista com o marido.

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