A possível privatização da Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan) pode lançar um novo ponto de interrogação sobre o futuro dos serviços de abastecimento de água e tratamento de esgoto em Santa Cruz do Sul. Isso porque o contrato assinado em 2014 entre a Prefeitura e a estatal prevê extinção no caso de a empresa deixar de pertencer ao Estado.
A decisão de desestatizar a companhia foi anunciada em março do ano passado pelo então governador Eduardo Leite (PSDB). O plano inicial, no entanto, era fazer uma oferta de ações (IPO, na sigla em inglês). Assim, o Estado, que hoje detém 99,9% do capital da empresa, perderia o controle acionário, mas manteria em torno de 30% dos ativos, permanecendo como um acionista de referência.
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Em julho deste ano, após questionamentos do Tribunal de Contas do Estado (TCE-RS), o governo resolveu alterar o modelo e vender 100% da estatal. Assim, o Estado não terá mais participação na empresa, como ocorreu com a Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE) e a Companhia de Gás do Rio Grande do Sul (Sulgás). O edital foi publicado no fim de novembro e o leilão foi marcado para o próximo dia 20. Nessa sexta-feira, o processo foi suspenso por uma liminar do Tribunal de Justiça (veja abaixo).
Caso se confirme, a venda levará o contrato de Santa Cruz a um cenário de insegurança, uma vez que a cláusula 30 prevê, entre as causas de extinção, a hipótese de a Corsan “deixar de integrar a Administração Indireta do Estado”. Para a Procuradoria-Geral do Município, a redação sugere que a extinção seria compulsória, ou seja, a Prefeitura nem sequer teria a opção de manter o contrato.
Conforme o procurador-geral adjunto Jefferson Zanette, se o leilão acontecer, o Município vai notificar a Corsan para que se manifeste em relação ao assunto. A cláusula é uma peculiaridade do contrato de Santa Cruz, que foi assinado após uma longa negociação com a estatal. O município chegou a ficar seis anos sem um contrato em vigor.
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Segundo Zanette, como Santa Cruz é um cliente importante para o sistema da Corsan, é provável que a empresa, sob nova gestão, procure preservar o contrato, o que pode levar a uma discussão judicial. No caso de a extinção ocorrer, a Prefeitura teria que municipalizar a gestão dos serviços ou escolher uma nova empresa por meio de licitação, já que o novo Marco Legal do Saneamento eliminou a possibilidade do “contrato de programa”, assinado diretamente com a prestadora, como ocorreu em 2014. “Todas essas questões vamos ter que enfrentar, se acontecer. É uma situação que gera preocupação porque não tínhamos como prever”, disse Zanette.
Desembargador apontou “risco de difícil reparação” com o leilão
A liminar que paralisou o processo de privatização da Corsan foi tomada pelo desembargador Alexandre Mussoi Moreira, da 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça, a partir de uma ação ajuizada pelo Sindiágua, sindicato que representa os servidores da companhia.
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No despacho, Moreira afirmou que os argumentos apresentados pela entidade são “relevantes” e há “risco de dano grave ou de difícil reparação” caso a venda da companhia seja consumada.
Um dos fatores apontados na decisão é o de que a desestatização deixará o Estado “sem nenhum órgão de execução do saneamento básico”, o que violaria a Constituição Federal e também a Constituição Estadual, que prevê a obrigação de manutenção do controle acionário por parte do Estado nas sociedade de economia mista. O Sindiágua alegou ainda risco de rompimento de contratos com municípios.
Não há perigo de interrupção no serviço, diz Promotoria
Um dos aspectos que preocupam a Prefeitura é que uma extinção do contrato não dispensaria o Município de indenizar a Corsan por conta dos investimentos feitos pela companhia desde que assumiu a gestão do saneamento. Quando o contrato de 2014 foi assinado, ambas as partes reconheceram um valor indenizável de R$ 153,1 milhões.
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A previsão era de que o montante fosse considerado amortizado ao final do contrato, em julho de 2054. Já no caso de a delegação dos serviços ser extinta, o contrato estabelece que será considerado amortizado 2,5% do valor para cada ano, a partir da assinatura.
A situação também é vista com preocupação pelo Ministério Público. Segundo o promotor de Defesa Comunitária, Érico Barin, porém, uma eventual extinção do contrato não levaria a uma interrupção imediata da prestação do serviço. “O que certamente vai impactar imediatamente é no campo dos investimentos, os quais a Corsan está obrigada a realizar pelo contrato. E também vamos ter que ver os reflexos sobre o passivo, ou seja, aquilo que a Corsan já precisaria ter feito e não fez”, explicou.
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