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ROSE ROMERO

Arrependidos, quem nunca?

– Se eu pudesse voltar no tempo, não casava com o Haroldo.
– Mas então por que você casou com ele?
– Sei lá, na época me pareceu que era o certo a fazer.

Não se engane. Isso acontece com todo mundo. Chama-se arrependimento e, claro, não precisa ser necessariamente sobre casamentos. Nós nos arrependemos de muitas coisas. Coisas grandes e pequenas. Dependendo do tamanho do estrago, chegaremos às portas do além negando isso. Mas secretamente sabendo que teria sido melhor fazer diferente.

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No macromundo, aquele onde deixamos de ser “eu” para virar “nós”, acontece o mesmo. Tomamos decisões coletivas que mudam o rumo da história. Às vezes, leva-se anos para interpretar com razoável credibilidade determinado acontecimento. Outras vezes, é uma questão de horas.

Fernando Collor de Mello foi o primeiro presidente eleito pelo voto direto desde 1964. Foi, também, minha estreia na vida jornalística. Eu havia começado a trabalhar há menos de um mês quando fui destacada para cobrir sua vinda à cidade na condição de candidato. Cobrir não exatamente. Minha tarefa de foca se resumia a escrever um relato sobre o “clima” da visita.

Collor havia irrompido no cenário nacional de forma um tanto mágica em um partido de ocasião e em pouco tempo virara celebridade sob a alcunha de “caçador de marajás”. Sua chegada naquela tarde quente de novembro foi eletrizante. O helicóptero pousou barulhento no gramado do municipal e levantou uma nuvem de poeira da pista atlética. Era um homem bonito e jovem, com ares de estrela de cinema. Uma estrela apressada que se apresentava em vários comícios-relâmpago por dia deixando atrás de si uma multidão de admiradores.

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Perdida em meio ao público, fui salva pelo colega do rádio que me garantiu um cantinho no palanque. Não faço ideia do que Collor disse naqueles minutos loucos. Não lembro mesmo. Lembro de olhar o povo embaixo, fascinado como aos pés de um mito. E no meio daquele povo eu vi, igualmente deslumbrada, minha psicóloga.

Passava eu por um período complicado. Grana curta, carreira incipiente, amores confusos, cidade estranha, pouca idade etc. Queria acertar e não sabia como. Quem me ouvia era a terapeuta. A mesma que agora eu via a aplaudir o caçador de marajás.

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O homem se foi e me deixou com uma sensação incômoda: eu enfim sabia o que minha psicóloga pensava. Eu havia vislumbrado a alma dela. Nos meses seguintes, Collor chegou ao Planalto, a poupança foi confiscada, as contas bloqueadas e a esmagadora maioria de seus fãs desapareceu. Ainda assim, nunca tive coragem de perguntar se ela estava arrependida. Deveria estar. Mesmo que viesse a negar, gosto de pensar que lá no fundinho, bem escondida, vive nela a certeza de ter cometido um erro.

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