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MEMÓRIA

A Santa Cruz vista por Alfred Funke

Funke morou em S. Cruz de 1897 a 1902

Santa Cruz do Sul está em vias de completar seus 144 anos de emancipação a partir de Rio Pardo, no dia 28 de setembro, próxima quarta-feira. Pois essa localidade, originada a partir de um projeto de colonização oficial no interior do Rio Grande do Sul, recém havia completado duas décadas de autonomia quando um pastor oriundo da Alemanha, Alfred Funke, se instalou na região, mais especificamente em Rio Pardinho.

O ano era 1897, e ele próprio tinha menos de 30 anos (nascera em Wellinghofen, Kreis Dortmund, em 22 de abril de 1869). Permaneceu por cinco anos na colônia, e, após retornar para sua terra natal, ao final de 1901, deixou um dos mais extensos e instigantes legados bibliográficos do passado sobre essa área.

A partir do ano seguinte, 1902, Funke publicou diversos livros sobre o Brasil, em especial sobre Santa Cruz e sobre o Rio Grande do Sul. Partindo de Rio Pardinho, viajara por várias outras regiões gaúchas, e foi estendendo seu olhar acurado, atento, sobre a presença alemã e sobre o desenvolvimento no País todo.

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Ambiente da povoação santa-cruzense na virada do século 19 para o 20, na qual Funke viveu por cinco anos.

Ainda que seja reconhecido como um dos mais qualificados entre todos os estrangeiros que escreveram sobre o território gaúcho, sua obra nunca foi traduzida para o português. Isso vale para Aus Deutsch-Brasilien: Bilder aus dem leben der Deutschen im Staate Rio Grande do Sul (Do Brasil-Alemão: Registros da vida dos alemãos no Estado do Rio Grande do Sul, em tradução aproximada), que publicou já em 1902, em Leipzig, com 287 páginas e dezenas de fotos, cujo olhar é concentrado em Santa Cruz.

E vale ainda para Brasilien im 20. Jahrhundert (Brasil no século 20), publicado em Berlim, em 1926, após uma segunda visita que havia feito ao Sul do Brasil nos anos anteriores. Nessa ocasião, foi recebido inclusive por Borges de Medeiros, em Porto Alegre, quando este era o governador do Estado, como refere o professor e historiador René Gertz.

Entre um título e outro, Funke havia publicado quase três dezenas de obras, de memória, pesquisa e ficção, inclusive romances. Veio a morrer em 9 de outubro de 1941, em Charlottenburg, Berlim, aos 72 anos. Mas deixou um dos mais ricos legados culturais sobre a Santa Cruz do Sul do passado de que se tem notícia.

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Moradia da localidade de Rio Pardinho na época, em foto publicada no livro Aus Deutsch-Brasilien, de Funke.

Alfred Funke se tornou, após seu retorno para a Alemanha, em 1901, um eminente intelectual, cuja atenção foi voltada para temas os mais variados. Em verbete na internet, informa-se que estudara, entre 1888 e 1891, ou seja, em seus 20 anos, Teologia Evangélica na Universidade Halle/Saale. Chegou a lecionar na Alemanha antes de emigrar para Santa Cruz, onde teria atuado tanto como pastor, em Rio Pardinho, como eventualmente como professor, no atual Colégio Mauá, então a Deutsche Schule (Escola Alemã).

Em seus livros, particularmente em Aus Deutsch-Brasilien, descreve sua viagem ao Sul do Brasil e também a rotina na colônia alemã. Entre outros registros, fala sobre o cotidiano de trabalho nas propriedades de seus vizinhos, em Rio Pardinho, e a manutenção de hábitos e costumes junto a famílias que completavam cerca de quatro a, no máximo, cinco décadas em uma nova terra.

Livro publicado por ele na volta à Alemanha

Há alguns indicativos de que Funke teria tido dificuldades com parcela dos membros das comunidades nas quais atuava, em parte, certamente, porque vivia em constantes deslocamentos, movido por sua curiosidade, para outras regiões. Com isso, claro que acabava se descuidando de algumas das tarefas de rotina. Mas quis o destino que, no final das contas, graças às visitas que fez deixasse um dos mais ricos apontamentos, em cores nítidas e com muitas fotos, de como era a vida das famílias da época.

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Numa evidência de seu excelente domínio de escrita, Funke também se dedicou à elaboração de roteiros cinematográficos, quando essa arte recém despontava. E colaborou na imprensa, como jornalista, tanto sobre a imigração alemã no Brasil quanto na África. Seu olhar foi gradativamente se tornando político, o que já se revela em Was ist national? (O que é nacional?), de 1902. Quando a história ou a memória já nem davam conta do que pretendia expressar, apelou para a ficção, em várias obras, entre elas Der Lasso: Brasilianischer Roman (O laço: romance brasileiro), de 1922.

Na próxima quarta-feira, 28 de setembro, quando se comemoram os 144 anos de Santa Cruz do Sul, a Gazeta do Sul compartilhará com os leitores um trecho do livro Brasilien im 20. Jahrhundert, de Funke, em tradução exclusiva feita pelo professor Martin N. Dreher, especificamente para a ocasião.

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