O ano era 1824 e os primeiros imigrantes alemães desembarcavam no Rio Grande do Sul. Mais tarde, a partir de 1849, era a vez da Colônia de Santa Cruz receber 12 colonos de origem germânica. Esse pode ser considerado o marco para o início da formação do município, que hoje é uma referência em diferentes aspectos. Os fatos históricos relacionados à imigração e seus personagens estão preservados de diversas formas, tanto em documentos e livros como em registros de famílias que guardam a lembrança de seus antepassados. Aos 78 anos, o professor Osvino Toillier, vice-presidente do Sinep-RS, é uma dessas pessoas que ajudam a preservar a memória dos imigrantes.
Ele é descendente de Robert Toillier, que fora contratado pelo Império para lutar contra Juan Manuel José Domingo Ortiz de Rozas y López de Osornio, da Argentina, com compromisso de dois anos de serviço militar. Ao final, poderia optar por voltar para a Alemanha mediante passagem paga pelo governo brasileiro ou ganhar uma colônia de terras no país. A opção foi por ficar e, por isso, recebeu o lote 71, localizada hoje na localidade de Paredão, Alto Linha Santa Cruz, onde estão enterrados seus restos mortais.
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A história faz o professor lembrar de alguns momentos especiais em sua trajetória, como foi o encontro de descendentes da família realizado recentemente. Mas mais do que a confraternização, Osvino é muito zeloso com os aspectos históricos. Ele mantém documentos, fotografias, recortes de jornais, depoimentos e livros, tudo para reconstruir aspectos dos ancestrais. “São as ‘joias da coroa’, que tenho guardado com muito cuidado. Tenho particular apreço por estes documentos, talvez por me terem sido confiados por pessoas que acreditavam que eu cuidaria deles para sempre. Tenho guardados como verdadeiras preciosidades, desde a foto do bisavô imigrante às famílias de seus descendentes”, reconhece.
Ao analisar a trajetória familiar e pessoal, o professor destaca toda a contribuição dos imigrantes para a atual sociedade. Segundo ele, trata-se de algo especial, pelos valores que transmite e pela história de vida. “Somente quando a gente se detém a analisar a biografia é que se compreende a grandeza de sua vida, a contribuição para a história da família. Ele merece ser reverenciado como personagem especial e respeitado como herói”, afirma.
Um aspecto que destaca-se neste contexto fica por conta da valorização por parte dos mais novos. Para o Toillier, os imigrantes estão sendo gradativamente valorizados como heróis de um tempo que as jovens gerações estão acolhendo em sua história, prestando-lhes o devido respeito e gratidão. “Nenhum povo se faz pela sua própria história. Cada povo bebe na cultura de outro tempo, inspira-se no exemplo dos antepassados e imita sua história. O tributo que as gerações de hoje prestam aos antepassados é um exemplo inspirador desta realidade”, define.
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E para preservar esses traços e marcas da imigração, não são poucas as manifestações de caráter cultural. As festas populares, como as que são realizadas por ocasião do 25 de julho, por exemplo, têm uma grande importância. “Eu curto muito isso e me emociono com o que observo. Tanto na cultura alemã, quanto italiana e de outros grupos de imigração, sem esquecer portuguesa e da cultura local, há vasto espaço para acolher e valorizar o legado dos imigrantes”, sintetiza.
É preciso preservar a memória do imigrante
Há poucos dias, uma situação deixou o professor Osvino Toillier bastante chateado. Os atos de vandalismo praticados em um cemitério de Rio Pardinho, onde estão alguns dos seus antepassados, causaram-lhe “indignação e revolta”. “Olhar para sepultura depredada é por demais triste, sem perspectivas de encontrar explicações para tamanha baixaria. Não há explicação para quem executou tamanha barbaridade na calada da noite, pela primeira vez em mais de 40 anos, desde que meu pai está enterrado neste cemitério, em cuja sepultura também a cruz foi roubada”, escreveu.
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O sentimento do professor tem explicações por tudo o que representa em termos sentimentais e históricos. Com uma inegável gratidão pelos feitos dos antepassados, ele reforça a importância dos valores que foram deixados e pelo exemplo que a todos inspira. “Enfim, ao olhar para nossa terra, deve emocionar-nos o patrimônio que nos deixaram. Dorme no silêncio das idades um legado silencioso pelo qual temos de ter respeito e admiração. E reverenciá-lo como panteão de nossa memória.”
Legado para todos
A imigração de um modo geral contribuiu para estimular o desenvolvimento em diferentes áreas. E em Santa Cruz do Sul não foi diferente, especialmente graças ao fortalecimento da agricultura, que movimenta uma importante cadeia industrial. Mas teve muito mais, como se vê diante da análise acerca da indústria e dos serviços, como é o caso da educação. Tudo isso, analisa o professor Osvino Toillier, contribuiu para a cidade prosperar.
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E em sua trajetória de vida, a educação é uma grande responsável por uma mudança de realidade. Nascido no interior, ele viveu com os pais até os 15 anos, quando foi para o internato do Colégio Mauá com auxílio de uma bolsa de estudos do governo do Estado, que havia sido pleiteada por líderes da comunidade em razão de seus bons resultados no primário. “Esta foi a primeira grande ruptura da minha vida. Foi muito difícil para minha mãe, especialmente, abrir mão da primeira força de trabalho na lavoura, já que meu pai era um homem doente, muitas vezes hospitalizado”, conta.
Mas foi nas salas de aula do internato que ele transferiu toda a seriedade e dedicação que poderia ter e logo veio o reconhecimento dos professores. Tanto que obteve o primeiro lugar e a melhor média durante todo o Ginásio, com 9,25 pontos. Depois, ao cursar Técnico em Contabilidade à noite, podia trabalhar como auxiliar de cozinha e limpeza no internato. Mais tarde, com a ida ao serviço militar, Toillier afastou-se da escola, mas aceitou voltar a trabalhar no Mauá em 1964, em razão do vínculo afetivo que havia adquirido com o colégio.
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Formado em técnico contábil, depois foi cursar Letras em extensão da Universidade de Pelotas, em Bagé. Ainda acadêmico, começou a lecionar no Mauá e no Científico do Colégio Estadual Ernesto Alves de Oliveira. “Mas, em 1971, a direção do Colégio Mauá me convenceu para a dedicação exclusiva. Assumi a vice-direção do estabelecimento e, a partir de 1974, juntamente com minha esposa Silvania, a direção do Internato Feminino, até 1979, quando assumiria a direção-geral do Colégio Mauá em razão da aposentadoria do diretor Hardy Elmiro Martin, o grande benfeitor de minha vida. Ele se dedicaria ao Museu do Colégio Mauá e ao Arquivo Histórico”, recorda Toillier.
Com o sentimento de gratidão ao Colégio Mauá e tudo o que este representou em sua vida, o professor Osvino destaca a importância da educação. “A gente vivia e respirava ‘educação’. E dia e noite, e onde se estivesse, a gente estava no meio da educação”, diz. E tudo isso foi o que possibilitou seu avanço e mudança de realidade.
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Expediente
Edição: Dejair Machado ([email protected])
Textos: Dejair Machado, Marcio Souza, Marisa Lorenzoni e Romar Beling
Diagramação: Rodrigo Sperb
Confira o caderno na íntegra » Dia do Colono e Motorista: data para celebrar tradição, história e trabalho
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