O costume de ligar a luz no interruptor ainda acompanha Noemia Müller ao entrar em casa, em Alto Boa Vista, interior de Santa Cruz do Sul. A lâmpada da sala, no entanto, não acende desde a última terça-feira pela manhã.
A faxineira de 62 anos estava no trabalho quando recebeu uma ligação do marido, Enio Müller, de 72 anos, relatando uma queda de luz decorrente do temporal que atingiu a região nas primeiras horas daquele dia. Desde então, até a noite dessa quinta-feira, 31, a energia elétrica não voltou no ponto em que o casal mora, nas imediações da igreja católica da localidade.
Noemia diz que estaria tranquila se os únicos problemas fossem os banhos gelados, a escuridão à noite e as carnes, verduras e outros alimentos estragando na geladeira. Contudo, a energia elétrica é fundamental para ligar os aparelhos de oxigênio e nebulização que o marido precisa utilizar, depois de duas cirurgias para retirar tumores na garganta.
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“Ele tem muita tosse durante a noite, falta de ar, e sem luz não temos o que fazer. É triste demais estarmos nessa situação desde terça. E o pior é que a gente sabe que eles não virão logo para religar a luz”, afirmou a aposentada, lembrando de casos em que demorou quase duas semanas até que a energia retornasse.
Diante dos percalços envolvendo a falta de luz na casa dos Müller, a solução foi improvisar. Sob a chuva fina do início da tarde dessa quinta, Noemia puxou a energia da casa da vizinha Sidônia Luedke com um rabicho de 50 metros, passando por uma valeta sob a terra na estrada de chão que a própria aposentada fez com as mãos, após ter pedido folga do trabalho para fazer o serviço. A residência da vizinha tem energia elétrica porque o transformador é outro.
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“Foi a maneira que encontramos para conseguir carregar um pouco o nosso celular e conversarmos com os filhos, ou mesmo ligar algum equipamento”, afirmou Noemia. A caixa de picolé que ela comprou para as netas também precisou ser levada para a geladeira da vizinha. Na noite de quarta-feira, o jeito foi levar o marido Enio à casa de Sidônia para que ele utilizasse o aparelho de oxigênio. O liquinho a gás, emprestado da patroa, é a única fonte de luz durante as noites.
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Extensão e bateria para salvar a safra
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A exemplo do casal Müller, Fabiano Cesar Stuelp, de 28 anos, também precisou puxar a energia de uma vizinha através de um rabicho para manter o freezer ligado. No fim da tarde de segunda-feira, ele e o pai carnearam uma vaca e um porco na propriedade, também em Alto Boa Vista. Na manhã do dia seguinte, entretanto, quando estavam cortando a carne para guardá-la no freezer, a luz se foi. “Ficamos atordoados com os quilos de carne que poderiam estragar. Felizmente conseguimos puxar a energia da vizinha para não perdermos o abate”, disse Fabiano.
O rabicho também garante o funcionamento da tecedeira de tabaco. Já para controlar a temperatura do forno de secagem, Fabiano instalou uma bateria. “Nossa renda vem da agricultura. Temos que nos virar de alguma maneira para não termos mais prejuízos”, comentou o agricultor, que entrou em contato com a RGE para falar do problema.
“Quando liguei, me questionaram se havia queda de poste ou árvore e se era só na nossa residência. Respondi que era geral e falaram que iriam verificar. Depois recebi um SMS dizendo que não identificaram a falta de energia aqui e pediram para eu checar o disjuntor interno. Avisei novamente que continuava sem energia e não obtive mais retorno.”
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Sem previsão
Do mesmo modo que em Alto Boa Vista, moradores de localidades como Rio Pardinho, Alto Paredão, São Martinho e Boa Vista, além de alguns bairros de Santa Cruz do Sul, também relataram à Rádio Gazeta que estão sem energia elétrica há dias. Em nota à Gazeta do Sul, a RGE afirmou que o trabalho das equipes nas últimas horas, somado à ausência de novos eventos climáticos severos na área de concessão, já permitiu uma redução significativa no número de clientes sem energia elétrica.
Segundo a empresa, os temporais da última madrugada atingiram, principalmente, as regiões do Planalto Médio, Serra e Campos de Cima da Serra. “Neste momento, as equipes atuam na recomposição da rede a fim de religar a energia a 95 mil clientes, concentrados, em sua maioria, nas regiões citadas”, disse a nota. Por fim, a RGE revelou que não é possível dar uma previsão de retorno da energia, que será restabelecida conforme os trabalhos forem concluídos. Conforme a empresa, é importante que as pessoas registrem a falta de luz mesmo que algum vizinho já o tenha feito.
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