Depois de atuar no maior júri da história do Rio Grande do Sul, sendo a única mulher a defender um dos quatro réus julgados pela tragédia na Boate Kiss, a advogada criminalista Tatiana Vizzotto Borsa retorna à bancada de um tribunal. E esse retorno se dará em Santa Cruz do Sul, no próximo dia 13, no último capítulo de um dos casos de homicídio mais emblemáticos registrados nos últimos anos no município.
No julgamento da tragédia na Kiss, Tatiana defendeu o vocalista da Banda Gurizada Fandangueira, Marcelo de Jesus dos Santos. Em seu primeiro júri após o caso famoso, defenderá Renato Andrade Ferreira, de 34 anos, acusado de ser o mandante do assassinato de Tiago Aliandro Kohlrausch, 30 anos. O crime ocorreu na noite de 23 de setembro de 2019, uma segunda-feira, na Rua Walder Rude Kipper, Loteamento Motocross, Bairro Arroio Grande.
O mecânico concursado da Prefeitura de Santa Cruz do Sul morreu com quatro disparos de pistola calibre 380, efetuados por matadores de aluguel na garagem de sua casa. Renato, assim como sua companheira na época, Patrícia D’Ávila da Luz, de 22 anos, foram indiciados após uma investigação da 2ª Delegacia de Polícia, por homicídio triplamente qualificado (por motivo torpe, emprego de meio cruel e uso de recurso que dificultou a defesa da vítima).
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Patrícia é mãe do único filho de Tiago, que tinha 1 ano e cinco meses na época – hoje a criança tem 3 anos. Conforme as conclusões do delegado Alessander Zucuni Garcia, a mulher e o padrasto da criança planejaram e coordenaram o assassinato do funcionário público. O objetivo seria afastar o pai biológico do filho.
Gabriel Nascimento da Luz, 53 anos, tio de Patrícia, era o dono do veículo usado pelos matadores contratados que foram à casa da vítima. Este, também a ser julgado no dia 13, responde por homicídio duplamente qualificado e será defendido pelo defensor público Arnaldo França Quaresma Júnior.
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A advogada Tatiana Borsa conversou com a Gazeta do Sul e foi categórica em afirmar: seu cliente é inocente. “O Renato foi meu aluno no curso de Direito da Ulbra, em Porto Alegre. Sempre foi muito humilde. Quando tinha dúvida de qualquer coisa, me perguntava”, diz Tatiana. “Quando esse fato aconteceu, fiquei muito surpresa, não acreditei. Tanto que fui conversar com ele umas três vezes no presídio. Também conversei com o delegado responsável. Não acredito de maneira alguma que ele tenha feito isso.”
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Tatiana é natural de Passo Fundo e mora em Porto Alegre desde 1994. É formada na Universidade Luterana do Brasil (Ulbra) e leciona na Faculdade São Judas Tadeu, de Porto Alegre, na Ulbra de Canoas, Guaíba e Gravataí, e na Faculdade de Direito de Santa Maria. Entre os casos famosos em que já atuou, além do júri da Kiss, está a defesa das vítimas do rompimento da barragem de Brumadinho, em 25 de janeiro de 2019, que deixou 270 mortos e seis desaparecidos.
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Também advogou no chamado “Caso Teréu”, defendendo três homens acusados de assassinar o traficante Cristiano Souza da Fonseca, o Teréu, em maio de 2015, no refeitório da Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc). No júri de Santa Cruz, ela será assessorada pelo advogado Andrey Moreira.
Ambos reuniram-se com Renato na última terça, na preparação para o julgamento. “Sei que é um caso de repercussão em Santa Cruz e estamos estudando o processo. Muitos alegam que ele teria feito isso para separar o pai e assumir o filho, mas isso não é verdade. Ele tem mais dois filhos, era dedicado à sua profissão, não precisaria disso.”
“Vamos ter surpresa nesse julgamento”, afirma Tatiana
No primeiro júri do caso do assassinato de Tiago Aliandro Kohlrausch, em 15 de setembro de 2021, os debates foram intensos entre Ministério Público e os advogados que defenderam Patrícia – que acabou condenada a 16 anos. Na ocasião, defesa e acusação chegaram a ir para as réplicas e tréplicas. Em uma de suas falas, o promotor Flávio Eduardo de Lima Passos comentou sobre a cisão do julgamento de Patrícia e Renato.
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“Não pensem que foi por acaso que o júri da Patrícia está ocorrendo agora e deixaram o do Renato mais para frente. Fizeram isso para ela passar toda a culpa a ele agora e, depois, ele passar toda a culpa para ela”, disse Passos na ocasião, prevendo uma possível manobra da defesa. Mas Tatiana, por sua vez, lamentou o fato de seu cliente não ter sido julgado junto da mulher.
“Deveria ter sido junto o julgamento dos dois. Teriam que ter colocado ambos frente a frente, para que muitos dos fatos fossem esclarecidos ali. O Renato sustentava aquela casa, sustentava a família, e o carro em que andavam era dele. Temos várias mensagens nos autos do processo, que a Patrícia mandou de dentro do presídio, ameaçando o Renato e dizendo para que assumisse a culpa”, disse ela. “O Renato foi preso primeiro que ela. Fui na delegacia e no presídio, e ele me dizia que nem sabia direito o que estava acontecendo. Essa menina é a culpada e mentora de tudo. Ele não possui ligação com a criminalidade ou facção.”
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Sem revelar quais estratégias tomará para defender Renato no júri, Tatiana Borsa confirma que o réu irá exercer o direito de falar, quando solicitado pela juíza. “O Renato afirmou não saber se vai aguentar e disse que tem medo de morrer no tribunal. Tem uma cirurgia bariátrica pra fazer, devido ao peso, tanto que consegui colocá-lo em prisão domiciliar devido aos problemas de saúde. Ele está muito mal, mas disse que vai ao júri e se manifestará em plenário.” Por fim, faz mistério: “Preparem-se, que vamos ter surpresa nesse julgamento”.
Mensagem espírita
Na entrevista à Gazeta do Sul, Tatiana Borsa também comentou sobre o julgamento dos quatro réus acusados pela tragédia na Boate Kiss. Ao longo de dez dias de júri, em Porto Alegre, um dos pontos com maior controvérsia partiu dela. A advogada apresentou aos jurados um áudio gravado por um radialista de um trecho do livro Nossa Caminhada, em que consta o que seria uma mensagem psicografada do cachoeirense Guilherme Pontes Gonçalves, que perdeu a vida no incêndio em Santa Maria.
“Consegui um exemplar do livro por acaso, mandei gravar e escutei em uma madrugada, tão logo recebi o áudio por mensagem. Foi chocante. Eu sou espírita e já tinha decidido que ia usar uma mensagem espírita no final da minha fala. Mas não estava preparada para essa mídia toda que se criou em torno disso”, admitiu Tatiana. Sobre o júri da Kiss, ela contou que jamais imaginou que daria tanta repercussão.
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“Surpreendeu o fato de eu ser a única mulher na defesa dos réus. Foi um júri bem pesado, com muita pressão psicológica, algo que fugiu mesmo de todos os parâmetros. Minhas redes sociais se encheram de seguidores e até hoje respondo mensagens sobre o júri da Kiss. Também venho realizando palestras, e vários caminhos e portas se abriram”, disse ela.
“Eu pedi para conversar com os pais das vítimas da Kiss posteriormente. A administração do grupo me comentou que, naquele momento, não estavam preparados. Quero muito ainda falar com os pais do Guilherme, que são de Cachoeira do Sul. Uma hora vai dar certo.”
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