O governo municipal de Rio Pardo está envolvido em um inquérito instaurado pelo Ministério Público de Santa Cataria a partir de denúncia na Câmara de Vereadores de Florianópolis. Ela aponta supostas irregularidades em documentos da Associação São Bento apresentados no processo licitatório para a definição de prestadora de serviços à Secretaria de Educação da capital catarinense. A entidade não teria comprovado legitimidade nos atestados de capacidade técnica assinados pelo prefeito de Rio Pardo, Rafael Reis Barros.
O Diário Oficial de Florianópolis publicou em 2019 um edital de chamamento público para seleção de Organizações da Sociedade Civil (OSC) para firmar termo de colaboração com a Secretaria Municipal de Educação, com contratação no mesmo ano. Em julho, a Associação São Bento foi escolhida para assumir creches na capital catarinense. Ela enviou três documentos para demonstrar capacidade técnica. A OSC deveria comprovar e atender a requisitos como experiência prévia na realização do objeto da parceira ou de natureza semelhante.
Dois dos documentos apresentados pela associação apontam serviços prestados em organizações de São Paulo: o Instituto Care e a Sociedade Amiga e Esportiva do Jardim Copacabana. O terceiro atestado foi encaminhado pela Prefeitura de Rio Pardo, assinado pelo prefeito, sendo autenticado em maio de 2019 pelo 9º Tabelionato de Notas de Porto Alegre, onde consta que a São Bento administra uma creche no município, mas sem informações sobre o nome e endereço.
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Outro documento foi anexado após a instalação do inquérito pelo Ministério Público. Neste atestado, tanto o prefeito de Rio Pardo, Rafael Barros, quanto a secretária de Educação, Michelle Borges Zawadksi, confirmam a execução dos trabalhos pela Associação São Bento. No entanto, não há informações sobre o nome e o endereço da creche onde ocorreram os serviços e a parceria também não consta no Portal de Transparência.
No documento encaminhado pela Prefeitura de Rio Pardo consta que a associação presta serviços de gestão de escola de educação infantil no município, atendendo crianças de 3 meses até 5 anos e 11 meses. Porém, o regimento padrão da Educação Infantil da rede municipal de ensino determina a idade para este atendimento a partir do quarto mês de vida e não o terceiro. Além disso, não há informações sobre o registro de contrato com o Município e pagamento à Associação São Bento pelo serviço prestado.
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Rompimento de contrato
A Secretaria de Educação de Florianópolis emitiu nota na terça-feira, 11, informando o rompimento de contrato com a Associação São Bento. “A medida foi tomada após receber relatório final da Secretaria Municipal de Transparência, Auditoria e Controle. O relatório indica que os documentos apresentados pela organização social não comprovam a legitimidade dos atestados de capacidade técnica”, informa.
Quando houve divulgação e veiculação de supostas irregularidades cometidas pela Associação de Saúde São Bento, a Secretaria Municipal de Educação exigiu explicações da entidade e protocolou ofício no Ministério Público de Santa Catarina colocando-se à disposição para os esclarecimentos necessários. A Prefeitura da capital catarinense lançará novo edital de chamamento público para contratação de uma Organização da Sociedade Civil para atendimento de crianças partir de 4 meses até 5 anos e 11 meses de idade na Educação Infantil.
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Associação é acusada de ser “laranja” no Rio Grande do Sul
A abertura do inquérito no Ministério Público de Santa Catarina ocorreu após pedido formal do Sindicato dos Trabalhados no Serviço Público Municipal de Florianópolis (Sintrasem), em novembro de 2019. A entidade pediu esclarecimentos sobre a prestação do serviço por parte da associação na cidade e alegou irregularidades no contrato com o município.
O MP ratificou que as investigações estão em curso e que não são conclusivas até o momento. Informa ainda que não tem nenhum envolvimento com o rompimento de contrato por parte da Prefeitura, embora reconheça seus méritos. O Ministério Público catarinense não tem previsão sobre o prazo para o fim do inquérito. Também não descarta uma aproximação com dados já levantados no Rio Grande do Sul.
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Além das investigações em Santa Catarina, o Ministério Público gaúcho apura a conduta da Associação São Bento. Segundo o órgão, a instituição é apontada como “laranja” do Instituto de Saúde e Educação Vida (Isev), acusado de improbidade administrativa no município de Dois Irmãos, onde administrou o Hospital São José entre 2014 e 2018.
A associação foi criada em 2017 e seria uma organização filantrópica, ou seja, sem fins lucrativos. Conforme documentos, a empresa estaria instalada em Porto Alegre, no Bairro Petrópolis, considerado de alto padrão.
O MP do Rio Grande do Sul aponta que a Associação São Bento teria recebido de forma ilegal valores desviados de contratos públicos firmados entre o Isev e prefeituras no Estado e também em Santa Catarina, entre setembro de 2017 e abril de 2018. Contudo, não há registro de prestação de serviços que justificassem o recebimento dos pagamentos.
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Rafael Barros garante que a documentação é legal
O prefeito de Rio Pardo, Rafael Barros, afirma que os documentos emitidos pelo Executivo estão corretos. Segundo ele, a Associação São Bento foi chamada para prestar serviço de gestão, mas nada relacionado à administração ou terceirização de escolas municipais de educação infantil (Emeis).
Barros conta que o Ministério Público de Santa Cruz do Sul solicita dados a cada três meses para monitorar vagas nas Emeis e, por isso, buscou uma empresa para fazer o levantamento de gestão. “Para ver se realmente eu estava pelo caminho certo. Tanto em número de professores quanto em número de creches, o que a gente poderia avançar para aumentar as vagas das Emeis”, explica.
Após, o prefeito comenta que recebeu a indicação do trabalho da Associação São Bento. “Mantenho uma preocupação na área da educação, pois é uma das maiores folhas de pagamento que a Prefeitura tem hoje”, diz Barros.
Quanto à falta de informações sobre a associação no Portal da Transparência e relatórios de Rio Pardo, Rafael Barros alega que o pagamento pelo serviço, no valor de cerca de R$ 2 mil, ainda não foi feito e só será quitado após a entrega dos relatórios. No fim do ano, a instituição deve apresentar uma análise final a respeito da Educação no município. “Como vou pagar algo que ainda não foi feito?”, questiona.
Barros esclarece que a consultoria apresenta pontos positivos e a serem aprimorados na educação municipal. Reitera que não há possibilidade de terceirizar o setor na cidade e que há uma diferença entre gestão e administração. “Eles fizeram a questão do levantamento de uma gestão. Não é administração de educação. É fazer o levantamento de gestão, do que eu posso mudar aqui. O objetivo principal é melhorar, cada vez mais, a educação de Rio Pardo”, destaca.
PRIMEIRO RELATÓRIO
A gestora escolar Gilda Mara Penha, ex-presidente do PSDB Mulher em Santa Catarina, foi chamada para exercer a análise de gestão de pessoas da Educação Infantil por meio da Associação São Bento. Gilda confirma que esteve em Rio Pardo e explica que foi até a Prefeitura e conheceu as Emeis. Depois, o primeiro relatório foi enviado ao prefeito.
Segundo declaração produzida pela Secretaria Municipal de Educação e direcionada ao chefe do Executivo, a gestora visitou três Emeis, acompanhada da Supervisora de Educação Infantil da secretaria, Alice Estilene Matte Corrêa. O documento — assinado pela então secretária Michelle Borges Zawadski; pela responsável pelos Recursos Humanos, Marcia Elaine de Carvalho, pela coordenadora pedagógica Nadir Paes da Silva Rodrigues e pela própria Alice — atesta a vinda de Gilda Penha ao município e confirma que ela levantou informações para um diagnóstico da Educação Infantil local.
De acordo com Gilda, o estudo objetiva aprimorar a Educação Infantil, especialmente em relação às vagas ofertadas. “Foi um trabalho bem interessante. Um trabalho que eu considero benfeito. Fui bem recebida em todas as creches”, destaca. Ela ainda reitera que o serviço não tem relação alguma com terceirização de administração das escolas.
Convite
Um grupo de seis vereadores de Rio Pardo protocolou na terça-feira, 11, documento na secretaria da Câmara pedindo que seja feito convite para o comparecimento do vereador de Florianópolis Vanderlei Farias, o Lela (PDT), em data ainda a ser agendada.
O objetivo é obter esclarecimentos sobre as denúncias feitas por ele sobre as supostas irregularidades. A solicitação foi assinada pelos vereadores Maria Salete Trabaina (PP), José Oniro Lopes (PTB), João Luiz da Rocha (PTB), José Henrique Unterberger Santos (PP), Eroi Tostes (PTB) e Valdenir da Rocha (MDB).
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