Foi a condução do enfrentamento à pandemia que fez de Auckland, maior cidade da Nova Zelândia, ser alçada ao topo do ranking dos melhores lugares do mundo para se viver, divulgado no início deste mês pela revista inglesa The Economist. E um santa-cruzense acompanhou de perto esse movimento.
Diogo Böhm está radicado em Auckland desde agosto de 2015. Formado em Ciências da Computação pela Unisc, transferiu-se para a Oceania para atuar como engenheiro de software na empresa onde um amigo já trabalhava. Saiu do Brasil com contrato assinado, visto e apenas duas malas, mas pronto para ficar. Passados quase seis anos, já é residente permanente, trocou de empresa, tem casa própria – que divide com a namorada Luciane de Souza, natural de Sobradinho e ex-moradora de Santa Cruz – e aguarda para encaminhar a cidadania assim que completar o tempo exigido por lei. E sem planos de ir para outro lugar.
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Com 1,6 milhão de habitantes, Auckland figura há vários anos entre as cidades destaque no planeta em termos de qualidade de vida. Desta vez, porém, pesou no indicador a resposta das localidades à crise da Covid-19. Embora tenha uma população de 4,9 milhões de pessoas, a Nova Zelândia registra até agora 2,7 mil casos confirmados e somente 26 mortes – a título de comparação, Santa Cruz tem 16,1 mil casos e 273 óbitos. Esse êxito desequilibrou o ranking a favor de Auckland: cidades europeias que lideravam até o ano passado patinaram no combate ao vírus e perderam colocações.
A estratégia neozelandesa foi tão bem-sucedida que os moradores nem chegaram a experimentar um longo período de isolamento, como na maior parte dos países. Foi em 24 de março do ano passado – um dia após Diogo completar 33 anos – que o governo decretou o primeiro alerta de nível máximo, após a confirmação dos primeiros casos. As restrições duraram cerca de 30 dias. Desde então, a economia foi sendo reaberta aos poucos e a rotina foi retornando a níveis muito próximos à normalidade, com alguns lockdowns pontuais. “Não vou dizer que foi fácil, mas foi por um mês só. Então não fazemos a mínima ideia do que é ficar isolado um ano e meio, como muita gente no Brasil. Isso é inconcebível”, conta Diogo.
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Atualmente, a circulação é livre e o uso de máscara nem sequer é obrigatório. Ainda assim, quem procura atendimento com sintomas gripais é testado e recebe orientação de ficar isolado até sair o resultado, o que leva entre 24 e 48 horas. “Existe o medo, mas a possibilidade de se infectar é muito remota”, acrescenta.
Parte desse sucesso é consequência do fechamento das fronteiras, que continua em vigor. Em abril deste ano, foram liberadas as viagens para a Austrália, o que criou uma espécie de “bolha” de livre circulação entre os dois países. “A vida aqui a gente segue normal, como se não houvesse vírus. A única diferença é que não podemos viajar para fora. Estamos meio presos, queremos ver nossas famílias, mas infelizmente não dá.”
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Aposta em testagem; vacinação lenta
Conforme Diogo, além do confinamento severo quando necessário, o país apostou em uma forte infraestrutura de testagem e sequenciamento de genoma, com o objetivo de rastrear a partir de onde o vírus se espalhava e entender as mutações que poderiam acontecer. “A visão do governo foi sempre de adotar uma estratégia de eliminação do vírus e não de contenção”, afirma o santa-cruzense.
Outros fatores também foram determinantes para o sucesso, na sua avaliação. Um deles foi a transparência do governo central em relação às políticas que eram levadas a cabo. Outro foi o alinhamento dessas políticas com as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS). Tudo com o objetivo não só de afastar o risco de uma sobrecarga sobre o sistema de saúde, que tem suas limitações, mas também de evitar uma escalada na mortalidade – que se concentrou na população mais velha, sobretudo entre residentes de casas geriátricas.
Esse desempenho garantiu a reeleição da primeira-ministra Jacinda Ardern, do Partido Trabalhista, em outubro. Hoje, no entanto, Ardern enfrenta críticas, principalmente quanto à lentidão na vacinação. Como o contágio está sob controle, a gestão não se preocupou em acelerar a compra de imunizantes, como em outras nações. A previsão é de que a população só esteja totalmente protegida no fim do ano, o que afasta perspectivas de reabertura das fronteiras antes disso.
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De acordo com Diogo, que só deve se vacinar em outubro, isso prejudica setores como o de TI, que enfrenta escassez de mão de obra.
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Clima ameno, opções de lazer e “praia por tudo o que é lado”
Para além da reação à pandemia, uma combinação de clima ameno e acesso a lazer é o que torna Auckland uma cidade diferenciada, conforme Diogo Böhm. A infraestrutura inclui um grande número de parques e áreas verdes, um agitado circuito cultural e diversos pontos turísticos tanto na cidade quanto nos arredores. “As pessoas têm um estilo de vida tranquilo, relaxado. E como é um país desenvolvido, nós temos acesso a muita coisa”, observou.
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Auckland está próxima, por exemplo, das regiões de Matamata e Hobbiton, onde ocorreram as gravações dos filmes da saga O Senhor dos Anéis – e que, por conta disso, atraem visitantes de todo o mundo. Também está perto do Monte Ruapehu, onde há uma estação de esqui.
Outro atrativo são as praias. O país costuma registrar invernos estáveis – neve e temperaturas abaixo de zero são raríssimas – e verões não muito quentes. “Tem praia por tudo o que é lado. Para o pessoal do Brasil, a água aqui é bastante gelada, mesmo no verão. O que é bom porque, para quem acostuma aqui, não tem tempo ruim no Brasil”, brinca.
Por outro lado, a cidade peca em mobilidade. Os congestionamentos são frequentes e o transporte público, embora seja a única opção para boa parte da população devido à escassez de vagas de estacionamento na região central, é caro e deixa a desejar. “Não se compara aos congestionamentos que tínhamos em Porto Alegre, mas é algo que incomoda”, comentou.
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