Andreia da Silva Conrad tem 15 anos, mas chegou aos 9 na casa dos pais. Juliana da Silva Conrad tem 12 e, aos 7 anos de idade, começou o que ela chama de “vida nova”. As meninas são filhas de Luciane, de 45 anos, e Darci Conrad, de 46. Morador de Rio Pardinho, em Santa Cruz do Sul, o casal optou pela adoção de duas crianças já com anos de história, mas que deram início a uma nova trajetória.
Luciane comenta que no momento do cadastro para habilitação, o casal não colocou perfil para restrição de idade, etnia ou gênero. “A assistente social da época até perguntou: mas e se tiver alguém com 17 anos? Eu disse que se for para ser, que seja, nós não colocamos essa restrição. Eu tenho a sensação que combina bem com a gente.” Hoje, as irmãs se dão mais do que bem, segundo a mãe. “Até demais. Inclusive, com o isolamento, elas meio que se fundiram.”
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Pendurada na cozinha da casa da família, uma frase expressa exatamente o que sentem: “O amor é o mais importante.” A decisão pela adoção foi decorrente da tentativa de ter filhos biológicos, que não se concretizou. “Os tratamentos seriam muito altos em questão de custos e optamos por adoção”, conta Darci. Andreia, a mais velha, recorda que, logo que chegou à família, ficou tímida. “Mas depois fui me soltando, fui conhecendo a casa e foi bem legal. O que eu sinto é felicidade.” Juliana, menos falante que a irmã, diz que lembra bem de quando chegou ao novo lar. “Quando conheci o pai e a mãe e vim para cá, foi uma vida nova”, afirma.
A realidade da família, porém, não é a mais comum quando se trata do tema. No Rio Grande do Sul, são 316 crianças e adolescentes disponíveis para adoção para 4 mil pretendentes. Atualmente, a Comarca de Santa Cruz do Sul conta com 63 habilitações ativas, sendo que há oito crianças e adolescentes disponíveis para adoção. O número maior de pretendentes que de acolhidos ocorre porque ainda há preferência maior por um perfil que não é o da maioria dos acolhidos.
Nessa última semana, atividades realizadas pelo Ministério Público fizeram alusão ao tema. A Semana da Adoção teve programação com eventos no formato virtual. A promotora da Infância e Juventude de Santa Cruz, Danieli de Cássia Coelho, conta que são diversos os obstáculos para que crianças e adolescentes encontrem uma família. “Muitas pessoas buscam essa via por outras questões subjetivas, como por exemplo, para tentar manter um relacionamento ou por terem uma visão errada, achando que adoção é um ato de solidariedade. Ou o desejo de querer um recém-nascido, muitas vezes com características germânicas, sem pensar na possibilidade de uma adoção tardia ou de crianças com doenças e que, apesar destas, podem ter uma vida absolutamente normal.”
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Como funciona o processo de destituição
A promotora Danieli salienta que o acompanhamento do MP nas demandas da infância e juventude é realizado de muitas maneiras, muito antes da adoção propriamente dita. “A Promotoria, recebendo denúncias pela rede protetiva de crianças em situação de risco ou violação de direitos, ou sendo cientificada pelo Conselho Tutelar, escolas ou unidades de saúde, instaura um procedimento para cada criança ou adolescente com o objetivo de auxiliar o núcleo familiar a garantir maior protetividade à sua prole, direcionando-o aos serviços da rede.”
Não havendo adesão às orientações recebidas, ou se a família não comparece nos atendimentos, é realizada uma audiência no âmbito administrativo para advertir os pais e reforçar a importância da mudança da dinâmica familiar. “Nos casos graves, o Ministério Público ajuíza a ação de acolhimento institucional, caso não se consiga fazer com que o protegido permaneça na família. Depois, não havendo a reorganização da família, o MP ajuíza a destituição do poder familiar, que visa o rompimento de fato e de direito da criança com seus genitores e responsáveis, e somente após a procedência desta ação é que é possível a adoção dela por candidatos devidamente habilitados.”
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A promotora completa que outra forma de atuação ocorre nos casos de gestantes já conhecidas da rede protetiva, que fazem uso de drogas ou mesmo já foram destituídas do poder familiar de outros filhos e que não se reorganizaram. “Nesses casos a praxe é ajuizar diretamente a destituição do poder familiar e o acolhimento institucional, para que esta criança seja resguardada desde o nascimento”, completa.
A juíza da Infância e Juventude da Comarca de Santa Cruz do Sul, Lísia Dorneles Dal Osto, ressalta que, uma vez destituído do poder familiar, não há reversão da sentença “Quando elas estão disponíveis para adoção, quer dizer que a ação de destituição já se encerrou, já transitou em julgado. Paralelo a essas oito crianças e adolescentes disponíveis, há outras tantas que estão com os procedimentos andando”, explica a magistrada.
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O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul possui também o programa Entrega Responsável, que é quando a gestante decide entregar o bebê para adoção, independente do motivo que leve a mulher a isso. “Ela tem o direito de decidir por si que quer entregar a criança para adoção. Os hospitais aqui são bem preparados para esse tipo de situação. Não ocorre com frequência porque não é uma decisão simples de ser tomada”, relata a juíza. “Após, prossegue-se na busca de uma família e há dez dias para arrependimento, a contar da audiência. Normalmente é uma situação tranquila e imediatamente já é feita a destituição. Para que a criança seja adotada, tem que estar destituída do poder familiar. A entrega responsável é rápida porque a vontade está manifesta.”
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