Para quem não curte a folia do Carnaval, a época geralmente é marcada por um grande estoque de comida e filmes em casa. Mas para um grupo de seis mil brasileiros, estes seis dias antes e depois do feriado são o ápice do ano. Para grande parte desta multidão, a Fazenda Evaristo em Rio Negrinho – SC é o lugar mais lindo do mundo.
No local acontece o Psicodália, evento multicultural que reúne shows e apresentações de cinema, teatro, e oficinas. Já conhecia o evento há três anos, mas sempre estava trabalhando na época de sua realização, e em 2016 pela primeira vez pude conferir de perto do quê meus amigos tanto falavam.
Para quem tem interesse em participar, excursões partem de vários locais do país, incluindo daqui do Vale do Rio Pardo. O passaporte dá direito a todos os dias do evento, e não existe a possibilidade de compra de apenas um dia. A hospedagem no local é em acampamento, com estrutura de banheiros e chuveiros, além de praça de alimentação e mercearia. O passaporte varia entre 320 e 400 reais dependendo do lote em que você comprar. No local, o dinheiro é colocado no Cartão Dália, moeda do evento, onde você coloca créditos e pode usar para comer, beber e adquirir souvenires.
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Os shows impressionam: em anos anteriores Gong e Jethro Tull. Em 2016, as atrações principais eram John Kay e Steppenwolf (do clássico Born to Be Wild), Elza Soares, Naná Vasconcelos, Replicantes, Bixo da Seda e Nação Zumbi. Entre os meus shows preferidos, aqueles de bandas brasileiras sensacionais e quem não tem o destaque que merecem, como Terra Celta, Confraria da Costa, Francisco El Hombre, Trombone de Frutas, Orquestra Friorenta, Casa de Orates, Cadillac Dinossauros, Apicultores Clandestinos e Skrotes.
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A magia começa nas fundações do ‘Dália’, como o festival é carinhosamente chamado. Os princípios que imperam são os da ecologia, da igualdade, da liberdade, do respeito, da cooperação e do amor. Existe um senso de comunidade inexplicável. Experimente unir seis mil pessoas com diferentes visões de mundo em um grande acampamento. Parece uma receita para o desastre? Pois não é. Estive no evento todos os dias e posso afirmar que não presenciei nenhuma briga, nenhuma discussão, nenhuma violência de nenhum tipo.
Muito pelo contrário, o clima no local é de ‘respeite e seja respeitado’. Por lá se encontram participantes de todas as idades, de várias partes do Brasil. Muitas famílias, com crianças de colo, que começam a andar, ou até mesmo em idade escolar; e nem os animais de estimação escapam. Todos fazem parte deste caldeirão.
De certa forma, no Psicodália todas as coisas boas dentro de cada um de nós são ampliadas. Quem é bom, fica melhor. Os sorrisos são frouxos, os abraços amistosos. A dança é desavergonhada. A individualidade é respeitada. Nunca na minha vida me senti tão confortável em minha própria pele; não existem julgamentos. Você pode simplesmente ser quem é, se vestir como gosta e fazer o que quiser e todo mundo vai te apoiar. O mundo não seria um lugar mágico se sempre as pessoas fossem assim?
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Todas as vezes em que vi as fotos do Woodstock e fiquei triste pensando que nunca poderia vivenciar algo remotamente similar, foram esquecidas nos últimos seis dias. Por que a essência de comunidade, liberdade, paz & amor, estão todos neste festival. Da mesma forma, todas as vezes em que me senti desesperançada pela humanidade (a que vemos definhar todo os dias numa espiral de consumismo, misoginia, homofobia, racismo, e preconceito), foram esquecidas. Nunca pensei ser possível estar em um local longe de casa, cheio de gente estranha, e mesmo sendo mulher me sentir segura e respeitada o tempo todo. Durante seis dias, vivi no paraíso das minhas utopias. Durante seis dias fui feliz.
A impressão que fica depois de alguns dias de Psicodália é de fé na humanidade restaurada. O mundo seria um lugar melhor se cada um de nós fosse um pouco mais Dália.
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