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Alexandre Garcia

Trezentos picaretas

“Há no Congresso uma minoria que se preocupa e trabalha pelo país, mas há uma maioria de uns 300 picaretas que defendem apenas seus próprios interesses.” A constatação é de 1993, do presidente do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, depois de ter sido, por quatro anos, deputado constituinte. Dois anos depois, a constatação virava música dos Paralamas do Sucesso: “Luiz Inácio avisou, Luiz Inácio avisou /São trezentos picaretas com anel de doutor”. O tempo passou, a prática continuou, e em fevereiro de 2015 foi o ministro da Educação de Dilma, Cid Gomes, que avisou: “Tem lá uns 400, 300 deputados que, quanto pior, melhor pra eles, que querem que o governo esteja frágil, porque é a forma deles de achacarem mais, tomarem mais, tirarem mais dele e aprovarem suas emendas impositivas.”

Semana passada foi a vez de um ministro de Bolsonaro, general Augusto Heleno, dar o aviso. Não o fez em público, mas numa queixa privada, para o ministro Paulo Guedes, captada por um microfone indiscreto: “Não podemos aceitar esses caras chantageando a gente o tempo todo. F…-se.” Mais tarde, em nota, o ministro da Segurança Institucional acrescentou: “Isso prejudica o Executivo e contraria os preceitos de um regime presidencialista. Se desejam o parlamentarismo, mudem a Constituição.

A Constituição de 1988 é a origem disso. Logo que foi promulgada, entrevistei o presidente José Sarney na TV e ele disse: “Esta Constituição torna o país ingovernável”. Em 2014, com 28 anos de observação, Sarney, que viveu a maior parte da carreira política no parlamento, acrescentou: “A compulsão de expandir poderes torna o país ingovernável. O parlamento desmoralizou-se, instituiu práticas condenáveis.” Eu cobri a Constituinte e sei como aconteceu. Estavam fazendo uma Constituição parlamentar e o presidente Sarney se mobilizou contra. De consolo, fizeram uma emenda presidencial, dando ao presidente a Medida Provisória. E criaram uma Constituição Frankenstein, na qual o presidente, que é responsável pelo governo, não tem os poderes para governar; quem tem esses poderes é o Congresso, que não tem a responsabilidade de governar.

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O resultado é que, para governar, os presidentes se entregaram aos partidos, cedendo ministérios e estatais, o que gerou a maior corrupção institucionalizada. Chamou-se isso de “Presidencialismo de Coalisão”, um eufemismo para esse Frankenstein. O atual governo interrompeu o acesso do monstro e afetou as “práticas condenáveis” e “os próprios interesses”, aplicando a separação de poderes, prevista na Constituição. A situação foi agravada com as emendas impositivas – dê o dinheiro aos deputados ainda que falte para quem tem o ônus de cobrar os impostos e governar. E agora articulam a derrubada de um veto do presidente, para usar mais R$ 30 bilhões, em ano de eleição municipal.

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