Ainda tendo muito presentes as interferências na rotina motivadas pela pandemia, em todas as localidades aproxima-se de forma muito célere o período que se convencionou chamar de eleitoral. Em meados de setembro, restam pouco mais de três meses para o final do ano. Em outros termos, em cem dias, pouco mais, em cada município, a seguir mantido o calendário do pleito, haverá novos governantes sentados nas cadeiras de tomada de decisão. O que deveria motivar certa vertigem em cada cidadão, em especial aquele que é eleitor e, como tal, é, mais do que convidado, convocado a se dirigir, dentro de dois meses, a local eleitoral e atribuir voto a um candidato ou uma opção que o sistema apresenta.
Diante do formato que hoje se adota no Brasil para a definição de novos governantes, novos gestores da municipalidade ou das demais instâncias de governo, não deixa de ser inquietante que apenas três meses (na verdade, bem menos do que isso) separem o município do ato de entregar a chave, a cadeira de comando, a uma pessoa que, em plena pandemia, talvez a maioria sequer cogite quem venha a ser. Qual empresa, empreendimento ou instituição, no ambiente que se nomeia de privado, fora da esfera pública, teria a coragem de escolher dessa maneira, com tamanha incerteza ou indefinição, com tamanha falta de critério ou de credenciais dos possíveis gestores, um tomador de decisão para no mínimo quatro anos? Como ter segurança, mínima que seja, como ocorre em tantos municípios, ao saber que será preciso ir às urnas e escolher alguém, mas dois ou três meses antes sequer se sabe quais serão as alternativas, quais suas credenciais, qual sua formação e seu real perfil em termos de virtudes, méritos, qualificação, entre tantos outros quesitos?
É de crer que nenhuma empresa ou entidade no mundo sequer cogitaria tal forma de sucessão. No entanto, é o que será feito em todo o Brasil. Alguma chance de um modelo assim dar certo com um mínimo de confiança, e de levar a bom termo? Talvez sim, talvez não, e estão aí os defensores ou analistas que pesam prós e contras, que têm uma ou outra opinião; como todas as demais áreas no Brasil, estas dificilmente conduzem a alguma síntese.
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Se é certo que os brasileiros terão de ir às urnas logo ali, para escolher prefeitos e vereadores, e se isso se mostra incontornável, talvez ao menos a sociedade, cada cidadão – e não apenas os diretamente interessados por serem candidatos ou estarem no mundo da política – pudesse refletir sobre a enorme temeridade de tal modelo de sucessão. Escolher em tais circunstâncias o gestor que, em cem dias, estará no comando de cada município soa tão incongruente e inconsequente quanto tentar trocar de motorista com o veículo em movimento em alta velocidade. E pior: sem sequer saber com quais ou quantos (candidatos a) motoristas contamos, sem saber se de fato têm habilidade para levar nosso carrinho adiante. O perigo não é pouco. E estamos todos juntos nesse carro.
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