Em oito anos, quase triplicou no País o registro de sífilis entre bebês até um ano de idade, passando de 1,9 caso para mil nascidos vivos em 2005 (5.832 casos) para 4,7 casos em 2013 (13.705). Para especialistas, isso é reflexo da falta de diagnóstico precoce e de tratamento correto da gestante infectada. A transmissão pode ocorrer na gravidez, no parto ou durante a amamentação.
Entre as gestantes, o salto nos registros é ainda maior: passou de 0,6 caso por mil nascidos vivos (1.863) em 2005 para 7,4 (21.382) em 2013. O Ministério da Saúde diz que não há aumento da sífilis, mas sim melhoria da notificação pela expansão do acesso a serviços de saúde de pré-natal e testagem sorológica.
Já os infectologistas e ginecologistas afirmam que, embora os registros tenham melhorado, o aumento dos casos de sífilis é real e que a escalada no grupo de mães e bebês, onde há notificação compulsória, só representa a ponta do iceberg. “Estamos vivendo uma nova epidemia de sífilis no país. Só no meu consultório, são pelo menos dez casos novos por mês, a maioria jovens que fazem sexo desprotegido”, diz o infectologista Artur Timerman, do Hospital Edmundo Vasconcellos.
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Mauro Romero Leal Passos, chefe do setor de doenças sexualmente transmissíveis da Universidade Federal Fluminense, confirma a escalada e diz que a sífilis não é exclusividade das grávidas. “Todos os que fazem sexo desprotegido estão sujeitos a se infectar. Mas hoje o foco está só na complicação [sífilis na gravidez], quando a doença já deveria estar sendo tratada lá atrás. Estamos enxugando gelo”, explica.
Sem tratamento correto, a sífilis na gravidez pode causar aborto ou morte do feto. O risco é de 40%. Se os bebês não forem tratados antes de um mês de vida, podem sofrer danos como cegueira, surdez e retardo mental.
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Ano passado, a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) lançou um plano para que os países da América Latina e Caribe reduzam a doença para 0,5 caso por mil crianças nascidas vivas-ou seja, no Brasil, a queda precisa ser 89,4%. Para os médicos, a alta taxa de sífilis congênita reflete falhas no sistema de controle das DSTs, nos programas de pré-natal e descumprimento dos protocolos pelas maternidades.
O Ministério da Saúde preconiza que durante o pré-natal se faça o teste para sífilis no primeiro trimestre, no último trimestre e no momento do parto. “A assistência ao pré-natal é desigual no país. Há lugares que fazem os exames [sorológicos], outros não. Isso vale para outras doenças, inclusive a Aids”, diz o infectologista Esper Kallás, professor da USP.
Segundo Passos, 25% das grávidas de regiões mais carentes não são testadas para sífilis durante o pré-natal. “Temos sorologia desde 1906, a penicilina é da década de 40. Não há razão para que essas grávidas não sejam testadas e tratadas”, afirma.
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Tanto ele quanto Timerman também relatam falta de penicilina em unidades de saúde. Estudos recentes apontam que uma dose do antibiótico pode reduzir em até 90% a transmissão vertical (da mãe para o filho). Timerman lembra que o parceiro da gestante também precisa ser tratado. “Se não for, ela pode voltar a se infectar e transmitir a doença na gravidez seguinte.”
A sífilis, também chamada de Lues, foi descrita pela primeira vez há aproximadamente 500 anos. Durante estes séculos sua importância foi destacada não só pela alta incidência como pelo aparecimento de formas graves, más formações produzidas nos recém-nascidos e sua grande mortalidade.
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