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Especial

Merenda com gosto de agricultura familiar na região

O alimento que entra no prato da merenda dos alunos das escolas da região tem cada vez mais o gosto das frutas e verduras frescas que saem das propriedades dos pequenos agricultores locais. Os municípios de Rio Pardo e Lagoa Bonita do Sul atingiram no ano passado o índice de 100% de utilização dos recursos repassados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) para a alimentação escolar na compra de produtos da agricultura familiar e do empreendedor rural. Doze localidades do Vale do Rio Pardo e Centro-Serra aumentaram o percentual em relação ao ano anterior, sete diminuíram, dois mantiveram o mesmo índice e dois não apresentaram o comparativo. Os setores responsáveis de outras seis secretarias de Educação não forneceram os dados.

Em vigor desde 2009, a lei determina a utilização de no mínimo 30% dos recursos do FNDE para a alimentação escolar na compra de produtos da agricultura familiar e do empreendedor familiar rural. Até novembro, os 23 municípios da região que forneceram os dados receberam o repasse de pouco mais de R$ 4 milhões para a compra dos itens. O valor total em 2015 atingiu quase R$ 4,7 milhões.

Destaque na compra de produtores locais, o valor total investido do FNDE em 2016 em Rio Pardo foi de R$ 282.583,30. A contrapartida investida pelo município somou R$ 692.960,16, totalizando o custo de R$ 975.543,46. O valor repassado pelo FNDE foi, pelo quarto ano consecutivo, 100% gasto na agricultura familiar, gerando alternativa de renda aos produtores, assim como a sua valorização e a oferta de alimentos regionais aos alunos. O restante da alimentação foi comprado com a contrapartida da Prefeitura, garantindo qualidade e oferta adequada de alimentação saudável e sustentável.

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Além de Rio Pardo e Lagoa Bonita do Sul, os municípios com mais altos índices de compra para alimentação escolar de produtores locais em 2016 foram Vale do Sol (90%), Estrela Velha (76%), Sinimbu (70,2%), Ibarama (70%), Santa Cruz do Sul (59,7%), Vera Cruz (57,3%), Pantano Grande (57%), Mato Leitão (53%) e Candelária (52,4%). Os índices mais baixos foram de General Câmara (30%), Arroio do Tigre (31,1%), Sobradinho (32%), Lagoão (32,3%) e Tunas (33,1%), mas Cerro Branco e Passo do Sobrado não informaram o percentual de 2016.

A nutricionista da Prefeitura de Sobradinho, Danielle Dedavid de Sá, explica que o município compra dos agricultores familiares, principalmente, saladas e beterrabas, que não impactam tanto quanto os produtos das agroindústrias – das quais compra basicamente bolachas e mandioca. Além disso, observa que não existe um frigorífico local em condições de fornecer carnes. Da mesma forma, não há como fazer a aquisição de leite e ovos de muitos produtores por falta de legalização.

Complemento custa caro aos cofres municipais

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Os valores repassados pelo FNDE são insuficientes para garantir a alimentação dos alunos e os municípios arcam com as despesas para complementar os recursos necessários às refeições. Em Rio Pardo, por exemplo, o investimento com recursos próprios no ano passado somou R$ 331.844,07, o que corresponde a aproximadamente 125% além do repasse federal. A previsão em 2016 era de gastar mais 130% na alimentação escolar além do valor liberado pelo FNDE.

O município de Santa Cruz do Sul gastou com a complementação de recursos na alimentação escolar R$ 1.232.013,19 em 2015 e R$ 1.379.757,65 em 2016. Em Venâncio Aires, o total gasto com a merenda em 2015 atingiu R$ 1.086.977,07. Desse valor, o FNDE repassou R$ 527.851,79 (48,5%). No ano passado, até 30 de novembro, o investimento total alcançou R$ 1.160.904,56. O repasse federal foi de R$ 556.300,00 (47,9%).

Em Vera Cruz, o valor da complementação do para custeio da despesa em 2015 foi de R$ 380.670,59 e em 2016, R$ 685.900,16. A contrapartida de Encruzilhada do Sul, em 2015, totalizou 50 mil (10 parcelas de R$ 5 mil) e em 2016, aproximadamente R$ 120 mil (10 parcelas de R$ 12 mil). Sobradinho, no ano passado, repassou para a merenda escolar aproximadamente R$ 367.499,10. Sinimbu gastou R$ 80.525,00, Passo do Sobrado R$ 39.048,75, Mato Leitão R$ 182.389,95, Herveiras R$ 73.102,94, Lagoa Bonita do Sul R$ 110.000,00 e Passa Sete R$ 45 mil.

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Os recursos repassados pelo FNDE à merenda são estabelecidos pela legislação, por meio de resolução de 14 de maio de 2012. São R$ 0,30 para os alunos matriculados no ensino fundamental, ensino médio e educação de jovens e adultos (EJA); R$ 0,50 de pré-escola; R$ 1,00 para educação infantil, turno integral; R$ 0,90 para os estudantes do Programa Mais Educação. Os valores são calculados com base no Censo Escolar do ano anterior.

Capacitações e visitas técnicas qualificam o trabalho

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Na Secretaria Municipal de Educação e Cultura de Santa Cruz do Sul (Smec), capacitações e visitas técnicas são organizadas com o objetivo de  integrar, informar e qualificar o trabalho das serventes. Cuidados de higiene e armazenamento são as principais orientações. A lógica “o primeiro alimento que entra é o primeiro que sai” também é reforçada a fim de evitar desperdícios e o vencimento dos produtos. A nutricionista Cinara Cereser Mussi comemora os resultados observados ao longo dos últimos seis anos. Entre eles estão a redução da perda nutricional, valorização dos produtos da região e aumento no número de associados da Cooperativa Regional de Alimentos Santa Cruz Ltda. (Coopersanta). De 22, o número de famílias vinculadas à entidade passou para 130 no ano passado.

É saúde que transborda

Natany Borges
[email protected]

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Polenta da vovó, galinhada, pizza caseira, suco integral de uva, cuca e até chocolate quente. São tantas opções de pratos salgados e doces que fica difícil os alunos da Escola Municipal de Ensino Fundamental (Emef) Olavo Bilac, de Rio Pardo, não torcerem para a hora da refeição chegar logo. A diversificação no momento de elaborar o cardápio tem uma origem especial (e saudável): é a agricultura familiar. Desde 2009 – quando entrou em vigor a lei que determina o uso de 30% dos recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) para a compra de produtos do segmento –, a instituição, em parceria com a Secretaria de Educação do município, buscou aprimorar cada vez mais as refeições oferecidas aos pequenos. Não é à toa que as combinações do cardápio, feitas hoje pela nutricionista Amanda Silva para 31 escolas, são renovadas a cada mês. Sempre com a premissa de suprir as necessidades nutricionais da gurizada e, claro, valorizar as frutas e verduras da estação. 

Rio Pardo, aliás, se destaca entre os municípios da região, já que, ao lado de Lagoa Bonita do Sul, gasta 100% dos recursos repassados pelo FNDE na agricultura familiar. Iniciativa que deixa a ex-diretora da Emef Olavo Bilac, Denise Silveira Silva, muito satisfeita. À frente da escola na gestão 2013/2016, ela relata que entre os principais benefícios sentidos constatados nos últimos anos está a melhora no desempenho dos alunos. “Eles passaram a vir mais animados para as aulas e o aprendizado, segundo as professoras, deu um salto. É lindo de ver.” Outro reflexo desse incentivo é a inserção das famílias. “Hoje temos crianças que comem ‘aqui’ os alimentos que os pais plantaram. Isso abre um precedente para a família diversificar a renda, já que muitos, até então, dedicavam-se somente à fumicultura.” 

A criação de novas agroindústrias para suprir a demanda da alimentação escolar também é observada em Vale do Sol, onde 90% dos recursos do FNDE são empregados na agricultura familiar. Conforme a ex-secretária de Educação, Magale Michel Kohl, o número de empreendimentos do segmento subiu de quatro, em 2013, para 13, até o fim de 2016. Um salto de 225%.  “É gratificante saber que quando se oferta um alimento ao estudante, se reconhece também o empenho de uma família da própria comunidade.” 

Segundo Magale, esse movimento empodera estudantes e familiares, pois agrega o sentimento de pertencimento. “Eles passam a entender que fazem parte do processo. São parte viva da escola. Além disso, também se desenvolvem como cidadãos conscientes sobre o consumo responsável”, complementa.

UM PROJETO, MUITAS MÃOS

Muitas são as mãos que trabalham para que o processo da alimentação saudável seja concluído com êxito nas escolas. Em Sinimbu, segundo a nutricionista Juliana Stona, reuniões mensais ocorrem com o objetivo de discutir e ampliar entrega, produção e novas oportunidades para os agricultores. “A mobilização dos produtores rurais está sendo feita desde 2010. É um trabalho gradativo e lento. Talvez somente agora estamos conseguindo que os agricultores acreditem e confiem na seriedade deste programa.” Ela destaca o trabalho da Emater, que se empenha para buscar novos mercados aos produtores. E o trabalho, segundo a avaliação da profissional, vem refletindo diretamente na autoestima das famílias. “Este incentivo faz com que eles percam o medo de aumentar a produção e se animem a produzir mais e diversificar. O resultado disso tudo, Juliana e todas as outras nutricionistas envolvidas com o projeto se orgulham ao confirmar: é o abandono de frituras e embutidos e o aumento no consumo de frutas e hortaliças. Enfim, saúde.

Criatividade conquista o paladar

Que a compra de produtos fresquinhos provenientes de pequenas lavouras contribui para uma refeição completa e saborosa, não há mais dúvidas. Mas há de se destacar que o trabalho das merendeiras também corrobora para conquistar o paladar dos pequenos. Na Olavo Bilac, a servente Sheila Petry, de 31 anos, é a responsável não só por preparar os cardápios já elaborados pelas nutricionistas, mas também por  adicionar originalidade às delícias servidas. 

Prova disso foi a inserção de quatro receitas criadas por ela no Caderno de Receitas Culinárias da Rede Municipal de Ensino. Na competição, organizada em 2014 e 2015 com o objetivo de valorizar os profissionais da alimentação escolar em Rio Pardo, a merendeira foi premiada com as combinações Polenta da Vovó (feita com queijo e carne moída), Suco Arco-Íris (bebida feita com couve, laranja e cenoura), Pastel Delícia e Rocambole Tentação (com banana caramelizada). “Eu adoro pesquisar na internet formas diferentes de elaborar os pratos. As crianças comem muito com os olhos. Nessas horas, é importante inovar”, diz, toda orgulhosa.

E a criatividade não cativa só as crianças. Professores, direção e demais funcionários da instituição só fazem elogios às invenções gastronômicas de Sheila. “Uma vez tínhamos vários pacotes de bolacha sobrando. Ao invés de só oferecê-las com leite às crianças, Sheila preparou uma torta de bolacha. O mesmo aconteceu no inverno, quando ela não só fez chocolate quente, como aproveitou para fazer um chantili”, lembra a ex-diretora Denise, já com água na boca.

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