As mudanças na estruturação da Souza Cruz, que atua na indústria do tabaco, devem mesmo se restringir ao fechamento da fábrica de cigarros em Cachoeirinha, a única da empresa no Estado. Em Santa Cruz do Sul, a usina de processamento de fumo continuará fornecendo matéria-prima para exportação e fabricação de cigarros.
Com o fechamento da estrutura em Cachoeirinha, atribuído ao aumento de impostos e ao contrabando no Brasil, a fabricação de cigarros deve se concentrar em Uberlândia, Minas Gerais, onde são produzidos 40 bilhões de unidades ao ano. Em Cachoeirinha eram em torno de 9 bilhões. A diretora jurídica e de relações institucionais da Souza Cruz, Maria Alícia Lima, diz que não há previsão de ampliar as estruturas da empresa no município mineiro, pois o volume de cigarro vem caindo por conta do contrabando.
A unidade de Santa Cruz, por sua vez, deve continuar fornecendo matéria-prima para exportação e para a fábrica de Uberlândia. Em curto prazo, não há previsão de mudanças no município. “Santa Cruz é a origem da nossa matéria-prima. O tabaco do Rio Grande do Sul é conhecido mundialmente pela sua qualidade. Não temos planos de parar de comprar a produção do Estado”, assegura Maria Alícia.
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Em longo prazo, no entanto, não se pode dizer o mesmo. O impacto pode chegar a Santa Cruz se o aumento de impostos e o contrabando não forem freados. “Relutamos em fechar a fábrica de Cachoeirinha”, resume a diretora. A possibilidade de encerrar as atividades era discutida há alguns anos, sobretudo a partir de 2011. A confirmação de dificuldade em manter as operações veio no ano passado, com o anúncio do aumento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) pelo Estado, e nos últimos dias, quando o governo federal elevou o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) em relação ao cigarro.
Conforme a Souza Cruz, anualmente são R$ 270 milhões em tributos para o Estado. No Rio Grande do Sul, continuam ocorrendo as atividades do Centro de Desenvolvimento de Produtos, em Cachoeirinha; na usina de processamento, em Santa Cruz; e na central de distribuição, em Porto Alegre. Embora o centro de pesquisas tenha sido instalado no local por causa da fábrica, a empresa não pretende realocar o centro.
Segundo Maria Alícia, as atividades do centro são independentes da fábrica e continuam ocorrendo normalmente. “O que acontece é a companhia avaliar oportunidades em diferentes locais. Sempre estamos avaliando a melhor logística”, esclarece. (Colaborou Pedro Garcia)
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Dificuldades pairam sobre todo o setor
O aumento de impostos e o contrabando, segundo a diretora jurídica e de relações institucionais da Souza Cruz, Maria Alícia Lima, geram dificuldades para todo o setor. “Não tenho dúvidas que fica difícil para o setor. O que posso dizer é que os concorrentes que atuam na formalidade estão sobrecarregados. O ICMS aumentou também em outras partes do Brasil e isso foi sentido fortemente”, explica.
Apesar das dificuldades, o grupo British American Tobacco, que detém o controle acionário da empresa, ainda tem uma visão positiva sobre o Brasil. “A matriz continua confiante de que é um País viável para se investir. Em termos de matéria-prima, tem qualidade. Mas precisamos de um compromisso maior dos governos federal e estaduais para o combate ao contrabando e para evitar o aumento de impostos, que podem colocar em risco uma atividade lícita de uma empresa que paga impostos e emprega”, analisa.
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O que representa a saída
O complexo da Souza Cruz em Cachoeirinha, segundo informações da assessoria de imprensa da Prefeitura, representa 3% do valor adicionado. Na época em que a fábrica foi instalada, em 2003, a representatividade da empresa era maior. Hoje, porém, conforme o poder público, empresas na área de logística detêm maior representatividade.
O fechamento da fábrica, em Cachoeirinha, provocará a demissão de 190 funcionários e a realocação de outros 50. Houve um acordo entre empresa e sindicato para garantir benefícios aos colaboradores que serão desligados. Entre eles está o pagamento, por seis meses, de valores correspondentes à cesta básica e ao plano de saúde, bem como bônus de 30% do salário por ano trabalhado. A empresa divulgou que vai oferecer um programa de transição de carreira. Conforme informou o Sindicato dos Trabalhadores da Indústria do Fumo de Porto Alegre e Cachoeirinha à imprensa da Capital, o fechamento está previsto para o dia 4 de abril.
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Como os funcionários não residem apenas em Cachoeirinha, acredita-se que o impacto será pulverizado e não apenas no mercado de trabalho do município, mas também em cidades próximas como Canoas, Esteio e Sapucaia do Sul. A própria Prefeitura, segundo a assessoria de imprensa, é a maior empregadora do município, com 3,5 mil vagas. A assessoria ainda informou que a Souza Cruz teria isenção de impostos pelos próximos anos.
OS PROBLEMAS
OS IMPOSTOS
O cigarro é hoje um dos produtos mais tributados do Brasil. Desde 2012, o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) que incide sobre o cigarro acumulou alta de 110%. Esta semana, o governo federal anunciou um novo aumento de 14%, que será aplicado em duas etapas, em maio e dezembro. A estimativa é de que, com isso, a carga tributária sobre o cigarro chegue a 80% ao fim do ano.
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No caso do Rio Grande do Sul, a situação ainda se agravou em função do aumento do ICMS, que entrou em vigor em janeiro. Além da elevação na alíquota-base, de 17% para 18%, o governo estadual fixou um adicional de 2% para alguns setores a fim de subsidiar o Fundo de Proteção e Amparo Social. Dentre eles, o fumo.
O PREÇO MÍNIMO
Desde 2012, a comercialização de cigarros no comércio está sujeita a um preço mínimo fixado pelo governo federal. Em um período de dois anos e meio, esse preço saltou de R$ 3,00 para R$ 4,50 – alta de 50%.
Esta semana, junto com a elevação no IPI, o governo anunciou que o preço mínimo passará para R$ 5,00 a partir de 1º de maio.
O CONTRABANDO
A produção regular de cigarros no Brasil caiu cerca de 30% nos últimos cinco anos. Enquanto isso, a participação de cigarros contrabandeados no mercado saltou de 20% para cerca de 31%. Isso indica que muitas pessoas estão deixando de consumir produtos regulares e passando a consumir os contrabandeados.
Um dos fatores que favorecem a expansão do contrabando é justamente o preço. Enquanto o preço mínimo engessa a concorrência, a carga tributária crescente alavanca o preço final. Em contrapartida, no Paraguai, que é a origem da maior parte dos produtos contrabandeados, a tributação gira em torno de 20%. Como o produto ingressa no território brasileiro à margem da Receita Federal, o preço acaba sendo muito menor – em média, R$ 2,50.
Governo do Estado vai estudar propostas para o setor
O governo do Estado, por meio da Secretaria de Comunicação, informou à Gazeta do Sul que respeita a decisão da Souza Cruz sobre o fim das atividades na fábrica de cigarros em Cachoeirinha. No entanto, não comentou especificamente sobre o aumento de ICMS que, junto com o IPI e a falta de políticas para coibir o contrabando, contribuiu para o fechamento da unidade. O governo assegurou, ainda, que um grupo trabalhará com propostas ao setor. Confira a nota na íntegra:
“Trata-se de uma decisão da empresa, certamente baseada em análise do mercado nacional e mundial, que lamentamos, mas respeitamos. Fomos comunicados sobre a decisão, que considerou diversos argumentos, como mudanças no IPI e o aumento do mercado ilegal, não havendo alternativa disponível, segundo a empresa. A Secretaria de Desenvolvimento coordenará um grupo de trabalho para estudar propostas para o setor.”
ENTREVISTA
Efraim Filho (DEM/PB)
Deputado federal e presidente da Frente Parlamentar Mista de Combate ao Contrabando e à Falsificação
João Pedro Kist
[email protected]
Gazeta do Sul – Há estudos que apontam que a participação de cigarros contrabandeados no mercado brasileiro disparou nos últimos anos. Por que o consumo de cigarros irregulares cresce ao invés de cair?
Efraim Filho – Já estou há dois anos fazendo esse alerta, de que o governo faz uma opção absolutamente equivocada de tentar arrecadar mais impostos das indústrias. O efeito disso vem sendo perverso para o setor privado. Esses produtos contrabandeados, como o caso do cigarro, se beneficiam de uma política tributária distorcida. O governo tem uma visão equivocada em acreditar que, em curto prazo, aumentar impostos seja a solução para aumentar a arrecadação. Muito pelo contrário, desse jeito os cigarros contrabandeados passam a ser mais atrativos ao consumidor. As pessoas compram o que cabe dentro do seu orçamento. E as empresas que pagam impostos, geram empregos e renda acabam diminuindo as suas vendas, chegam às vezes em seu limite e fecham.
Gazeta do Sul – O senhor acredita que pode ser uma tendência as empresas fecharem fábricas ou reduzirem a produção em função da expansão do mercado ilegal, como ocorreu com a Souza Cruz?
Efraim Filho – Eu acredito que agora foi a gota d’água essa situação para o setor produtivo. As empresas vêm se deteriorando porque o governo não faz a sua parte. O mercado informal se torna mais atrativo por conta dos preços menores.
Gazeta do Sul – O senhor concorda que a tributação elevada sobre o cigarro no Brasil estimula o crescimento do contrabando?
Efraim Filho – Com certeza. Quanto mais imposto, melhor para o mercado do contrabando. Se assim continuar, ele vai continuar crescendo. Muitas vezes o consumidor não tem consciência de saber que esses produtos oferecem risco à saúde e integridade.
Gazeta do Sul – O que pode ser feito para conter de fato o contrabando de cigarros e por que ainda não foi feito?
Efraim Filho – Tem poucas operações feitas pela Polícia. Foram feitas de forma isolada, na fronteira do País. As operações deveriam acontecer de forma permanente e ter uma maior fiscalização nas fronteiras. O governo precisa parar com essa visão de que, para arrecadar mais, é preciso aumentar impostos. Se o governo precisa arrecadar mais, a forma mais inteligente é combater a sonegação e o contrabando. No momento que ele aumenta o imposto, na verdade sufoca as empresas.
Gazeta do Sul – O aumento de impostos parece ser uma política do governo para tentar baixar o consumo de cigarros. Isso faz sentido?
Efraim Filho – Claro que não. Tem um mercado informal agindo com quase total liberdade. O produto que vendem é ainda mais nocivo ao cidadão, já que esses cigarros contrabandeados não obedecem às regras da Anvisa. Com certeza, a toxicidade dessas mercadorias é maior. O contrabando fecha empresas e oferece riscos muito maiores à saúde. Além do mais, o cidadão deve ser livre se quiser ou não fumar, mas precisa usar produtos que tenham procedência.