Quero falar de esperança. Aliás, preciso falar de esperança, embora a realidade cada vez mais carregue angústia e medo. No começo de janeiro fiquei sabendo que vou ser pai. Descobrir que “estamos grávidos”, que a Lu carrega nossa filha ou filho, foi a emoção mais grandiosa e linda da vida. É inexplicável, sensacional. E essa perspectiva me impõe a necessidade de acreditar que não vai ser neste mundo triste que a minha criança vai crescer. Por isso, preciso mais do que nunca ter esperança.
Quero ter tempo de mostrar para essa criaturinha, que deve chegar entre o final de agosto e começo de setembro, que vale a pena ser bom, correto e honesto. Quero ensinar que devemos ajudar uns aos outros, que a vida pode ser boa, que sempre vale a pena estender a mão para alguém em dificuldade. Quero que cresça, tome suas decisões, seja uma pessoa legal, descolada, pra frente.
Quero que ele ou ela conviva com os avós. Vô Francisco – que provavelmente vai chamar de vô Dedeco –, vó Janice, vô Waldomiro e vó Eni. Quero que conheça a bisa Ida. Tenho tantos planos e ideias, mas para isso preciso que eles estejam aqui. Preciso que sobrevivam. Eu também preciso ficar forte para acompanhar tudo isso. Preciso, especialmente, que a Lu fique bem. Que ela passe pela gravidez livre dessa peste que nos tirou o norte há quase um ano. Preciso que haja estrutura de saúde para atendê-la quando for preciso.
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Entretanto, isso não depende apenas de mim ou dos meus. Nós não somos ilhas, não vivemos isolados. Estamos inevitavelmente conectados uns com os outros. Precisamos, portanto, cuidar uns dos outros, zelar uns pelos outros. A minha esperança está atrelada à esperança de cada pessoa que está do outro lado deste jornal.
Estou cansado de dar notícias ruins, de falar de mortes, de ser o emissário das informações negativas. Meus colegas também estão. Imaginem, então, o nível de exaustão dos profissionais de saúde. Médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem e todos os outros envolvidos na linha de frente que dobram turnos e plantões para salvar vidas, mas que cada vez mais visualizam mortes.
Esta semana conversei com uma jovem técnica de enfermagem que atua na UTI Covid do Hospital Ana Nery, Carolina de Dolianitis. Ela contou que está há um ano sem ver a família, para não colocá-los em risco. Pense na força dessa mulher.
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Na última quinta-feira, 4, durante o Redação Interativa – que apresento de segunda a sexta-feira, das 18 às 19 horas, na Rádio Gazeta –, conversei com o médico Guilherme Fürst Neto, diretor técnico do Hospital São Sebastião Mártir, de Venâncio Aires. De todos os depoimentos que tenho ouvido, foi o que mais me tocou. As estruturas colapsaram e não há mais capacidade de atendimento para pacientes com Covid-19. Estamos perdendo a batalha.
Eu sei, a ideia era falar de esperança. Me perdoem, acabei saindo do tema. Acontece. Volto, então. Precisamos de vacinas! Nossa esperança está na vacinação. Elas têm que chegar. E logo.
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