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Abalo na economia

91 milhões de brasileiros deixaram de pagar pelo menos uma conta em abril

Foto: Pixabay

Com pouco mais de um mês de isolamento social, boa parcela da população vê as despesas se acumularem, sem pagamento. Pesquisa do instituto Locomotiva, obtida com exclusividade pelo jornal O Estado de S. Paulo, aponta que 91 milhões de brasileiros – o equivalente a 58% da população adulta do País – deixaram de pagar em abril pelo menos uma das contas referentes ao consumo de março.

Como comparação, no mês anterior, antes dos impactos da quarentena, eram 59 milhões (37%) com contas atrasadas – houve, portanto, um salto de 54% no período. “A Covid-19 chegou na reta final de uma crise econômica e encontrou uma população sem poupança”, afirma o presidente da Locomotiva, Renato Meirelles, explicando que o brasileiro não pagou as contas porque, na falta de uma reserva financeira, o dinheiro acabou.

Segundo a Anbima, a associação das empresas do mercado financeiro, só 10% dos brasileiros conseguiram guardar algum dinheiro ao longo do ano passado. “Quanto menor a renda, maior o endividamento relacionado a contas mais simples, como água, luz, aluguel ou carnês. Nas classes A e B, os destaques ficam para o cartão de crédito e mensalidades escolares”, diz Meirelles.

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De acordo com a pesquisa, cada brasileiro, em média, deixou de pagar quatro contas, sendo que as consideradas não essenciais estão entre as mais frequentes, como carnês ou crediários de lojas (renegadas por 46% dos entrevistados) e empréstimos com instituições financeiras (descartados por 36%). A liderança também tem duas das dívidas mais caras do País: o cartão de crédito (com juros de 322,6% ao ano, em fevereiro) e o cheque especial (130% ao ano, em igual período), ambos postergados por 37% dos brasileiros.

Na prática, uma dívida com o cartão de crédito mais que dobra de tamanho a cada seis meses. A pesquisa foi realizada entre 14 e 15 de abril e entrevistou, por telefone, 1.131 pessoas. A margem de erro é de 2,9 pontos percentuais, com intervalo de confiança de 95%.

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Na opinião de Isabela Tavares, economista da Tendências Consultoria Integrada, a pesquisa da Locomotiva surpreende pela magnitude dos resultados depois de um período relativamente curto de quarentena. “A gente esperava por esse salto no endividamento, mas ao longo do ano, não tão rapidamente”, diz a especialista, que estima que a massa de passivos gerada pela atual crise sanitária leve pelo menos dois anos para ser solucionada.

“Com os bancos, nós voltamos hoje aos níveis de inadimplência de 2017. Como esperamos um [índice de] desemprego de 14,5% neste ano, e uma melhora pequena no ano que vem, projetamos que a massa de endividamento deva voltar aos patamares de 2019 apenas em 2022”, diz.

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‘Elite’ da classe C deve puxar o endividamento

Sem direto ao auxílio emergencial de R$ 600,00 do governo e fora do radar dos programas federais de transferência de renda, 50 milhões de brasileiros que integram a “elite” da classe C, com renda familiar entre R$ 3.135,00 e R$ 6 mil por mês, devem puxar a alta do endividamento nos próximos meses. É o que aponta levantamento da consultoria Plano CDE, especializada em baixa renda, com base em dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), do Instituto Brasileira de Geografia e Estatísticas (IBGE).

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“Essa população, que não é a da fome, vai ser a do endividamento. Ela tem renda acima do teto estipulado pelo governo para o auxílio de R$ 600, mas, do seu orçamento, 60% são variáveis, dependem de ‘bicos’ e trabalhos autônomos, que estão parados no momento”, diz o diretor executivo do Plano CDE, Maurício Prado.

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O pacote de auxílio de R$ 600,00 atinge famílias com renda mensal de até meio salário mínimo (R$ 522,50) por pessoa ou de até três salários mínimos (R$ 3.135,00) no total da família. “Essa classe C não tem perspectiva de mais renda e tem 30% da receita já comprometida com financiamentos.”

Fundador da plataforma de autônomos GetNinjas, com 1,5 milhão de cadastrados, Eduardo LHotellier diz que, em média, esses profissionais têm menos de 30 dias de reservas para arcar com as responsabilidades financeiras. “Ele trabalha agora para pagar as contas que vencem daqui a pouco.”

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Para a economista da Tendências Isabela Tavares, após o pacote de auxílio do governo de R$ 600,00 a classe C passa a ser a mais vulnerável no enfrentamento da crise do novo coronavírus. “São famílias que sofrem com o desemprego, que investiram no empreendedorismo e, com uma renda maior, têm acesso ao crédito. Mas vão perder muita renda.”

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