De cada dez brasileiros e brasileiras, apenas dois assumem ser racistas, machistas ou homofóbicos, mas sete admitem já ter feito alguma declaração discriminatória pelo menos uma vez na vida. “Mulher tem de se dar ao respeito”, “não sou preconceituoso, tenho até um amigo negro” e “pode ser gay, mas não precisa beijar em público” são exemplos de comentários que expressam a reação da população diante da diversidade racial, de gênero, de orientação sexual ou estética.
“O brasileiro não tem consciência de que as coisas que diz demonstram preconceito”, afirma Márcia Cavallari, diretora executiva do Ibope Inteligência, responsável por mapear as práticas discriminatórias dos brasileiros em pesquisa inédita realizada em todo o País entre 16 e 21 de setembro deste ano.
O levantamento do Ibope, encomendado pela Ambev-Skol, questionou se os entrevistados têm algum tipo de preconceito. Das 2.002 pessoas abordadas, 17% disseram “sim” e 83%, “não”. Em seguida, os pesquisadores apresentaram frases racistas, machistas, homofóbicas e gordofóbicas, e perguntaram se eles já fizeram os comentários.
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“Quando perguntamos diretamente se a pessoa tem preconceito, ela acha que não. Mas, quando apresentamos frases preconceituosas, o índice aumenta”, diz Márcia. Entre os pesquisados, 73% admitiram ter falado frases como “mulher ao volante, perigo constante”, “ela tem cabelo ruim”, “isso é coisa de mulherzinha” e “ela é bonita, mas é gordinha”, entre outras.
A professora de inglês Lorena Monnerat, de 36 anos, já foi vítima de gordofobia e machismo. “O clássico é ouvirmos: ‘Ela é linda de rosto’. Na maioria das vezes, a pessoa não teve intenção consciente de ofender”, diz. “É muito chocante. Ela acha que é elogio dizer que, do seu corpo, salva-se o rosto. O preconceito está arraigado.”
A pesquisa mostra ainda que, entre os preconceitos velados, o machismo é o mais praticado. Quando questionados sobre os tipos de discriminações mais presenciados, 61% dos entrevistados disseram ter ouvido ou dito um comentário machista.
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Mulher
Entre as manifestações mais comuns, lidera a frase “Mulher tem de se dar ao respeito”. Para a antropóloga Regina Facchini, do Núcleo de Estudos de Gênero Pagu, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), esse e os outros três comentários ouvidos com mais frequência estão ligados à desigualdade de gênero e têm a sexualidade da mulher como ponto de partida. “É a distinção de mulher para sexo e para casamento. Em tese, uma ‘mulher decente’ não seria vítima de sexismo. A vítima seria a que não se dá o respeito. Mas os limites não estão muito claros, e qualquer deslize pode fazer a mulher ser rebaixada para o patamar de indecente.”
Em seguida, o racismo é o preconceito mais praticado – 46% relataram ter feito ou ouvido uma declaração discriminatória em relação a negros. O universitário Jonathan Vicentt, de 26 anos, sentiu “preconceito velado” dos frequentadores em um shopping de luxo quando entrou com bermuda e regata. “São olhares atravessados. Havia gente branca de bermuda e regata, e as pessoas não reparavam.”
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“As discriminações são estruturais, não são manifestadas por atos conscientes. Esses dados podem sugerir saídas para políticas públicas de combate às discriminações”, diz Silvio Almeida, doutor em Direito pela Universidade de São Paulo (USP), professor da Universidade Mackenzie e ativista negro.