Localizado a mais de 350 quilômetros de Santa Cruz do Sul, no Noroeste gaúcho, o município de Serro Azul surgiu na alvorada do século 20. Foi considerado uma oportunidade aos imigrantes alemães e descendentes que viviam nas colônias gaúchas e buscavam melhores condições de vida. A comunidade priorizou religiosidade, educação, saúde e economia. E para se estabelecerem no espaço, situado entre os rios Ijuí e Comandaí, os primeiros colonos precisaram se unir. E assim fundaram as bases para o futuro município, que em 1942 passaria a se chamar Cerro Largo.
Após mais de 120 anos de sua colonização, a cidade possui 13.705 habitantes, conforme o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A economia é baseada na agricultura, indústria e comércio. É o berço, por exemplo, das Lojas Becker, popular rede varejista que atua em todo o Brasil.
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Caminhar pelo centro do município é como viajar no tempo. Antigas construções (incluindo casas em estilo enxaimel), erguidas nas primeiras décadas, permanecem intactas. E na Praça da Matriz, que ocupa um quarteirão inteiro, monumentos identificam e valorizam os colonizadores responsáveis por povoar e desenvolver a cidade.
No fim do século 19, os imigrantes alemães que chegaram ao Rio Grande do Sul em 1824, e posteriormente seus descendentes, estavam estabelecidos nas regiões dos Vales – Sinos, Caí, Rio Pardo e Taquari. No entanto, havia a necessidade de expandir a colonização do território gaúcho em direção ao Oeste.
Na busca por novas terras, a associação de colonos Bauerverein passou a negociar, a partir de 1900, a colonização do território que futuramente se tornaria Cerro Largo. Em pouco tempo, uma comissão, liderada pelo padre jesuíta Max Von Lassberg, visitou o local antes de a compra ser concluída para se certificar de que a área era apropriada.
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O historiador Guido Henz destacou as exigências necessárias para receber os imigrantes alemães e seus descendentes. “Precisava ser uma área com muito mato para construir as casas e água para consumo”, afirmou. A avaliação foi rápida, e as terras foram logo adquiridas.
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Assim, em 4 de outubro de 1902, 12 pioneiros alemães (entre eles, o padre Max) fundam a colônia Serro Azul. O nome é uma alusão à tonalidade azulada das colinas que cercam o espaço. Com o tempo, os colonos foram chegando com suas famílias, com a promessa de prosperidade.
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Contudo, os primeiros anos não foram fáceis. Enxames de gafanhotos, proliferação de tifo, secas, queimadas e pestes assolaram a região por quase uma década. O desânimo abateu as famílias, que se mudaram durante o período. Diante das intempéries, os colonos precisaram se unir contra as adversidades. No fim, os serro-azulzenses, enquanto comunidade, triunfaram.
Entre 1903 e 1905, a colônia foi administrada pelo santa-cruzense Jorge Frantz. Restou ao doutor a tarefa de manter a moral e encorajar os habitantes a suportar as dificuldades. De acordo com a escritora Maria Dolores Schneider, autora do livro Vozes do Passado: de Serro Azul a Cerro Largo, sua principal preocupação era a saúde da colônia. Instalou uma pequena farmácia e trouxe uma parteira. Como reconhecimento ao seu trabalho, a avenida principal do município, onde está localizada a sede da administração, foi denominada Coronel Jorge Frantz.
A religião teve um papel fundamental no início da colonização, contribuindo na educação e no desenvolvimento econômico. E apesar da influência do jesuíta Padre Max e do predomínio de católicos, os primeiros diretores de Serro Azul fomentaram a harmonia com a comunidade luterana. “Havia a preocupação de Frantz, católico, e Helmuth Smidt, protestante, em promover a integração”, destacou o historiador Guido Henz.
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Um ano após a fundação da comunidade católica (em 1904), os fiéis, determinados a ter uma capela, assumiram a missão de conseguir os materiais necessários para a construção. Em 1907, a estrutura estava concluída.
No entanto, não pararam por aí. Em 1911, coletaram mais de 5 milhões de réis para a construção da Igreja Matriz. A edificação, com mais de 540 metros quadrados e duas torres com 48 metros de altura, foi inaugurada em 1921, em uma área estratégica localizada na frente da Praça da Matriz.
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Os primeiros evangélicos chegaram a Serro Azul em 1908. O então diretor Helmuth Smidt destinou-lhes terrenos em localidades no interior do município. A Linha Dona Otília foi o principal destino. Dois anos depois, construíram a primeira escola evangélica, que serviu de ponto de encontro de fiéis. A Comunidade Evangélica Martin Luther foi fundada em 1914 e a atual igreja foi construída em 1940.
A educação foi uma das prioridades desde o início da colonização. Conforme a professora Maria Dolores Schneider, os líderes consideravam-na um dos alicerces para a formação da comunidade. “As escolas eram as joias da colônia”, frisou. Nas primeiras três décadas, Serro Azul construiu pelo menos 20 escolas comunitárias, segundo o historiador Guido Henz, demonstrando a preocupação com o ensino das crianças. “A própria população pagava o salário dos educadores e garantia que não faltassem recursos”, afirmou.
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Em 1930, Serro Azul foi reconhecida como um polo educacional na região. A expansão se deu em diferentes frentes. Antes da emancipação, a colônia já possuía uma Escola Preparatória de Professores. A primeira escola estadual seria inaugurada em 1937, denominada Grupo Escola da Vila Serro Azul.
Ela ainda foi berço da primeira Escola Normal Rural do Rio Grande do Sul, em 1942. Durante 30 anos, foi responsável pela formação de quase 500 educadores que atuaram nas localidades rurais gaúchas.
Com a presença dos irmãos lassalistas, foi criado o La Salle Medianeira e aberto o curso ginasial em 1959, o primeiro da região. Após mais de cinco décadas, o colégio se tornou o maior instituto particular de ensino do município, e atende crianças de regiões vizinhas.
Atualmente, Cerro Largo ainda possui um campus da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), com dez cursos de graduação e quatro de mestrado. As duas unidades atendem as regiões Noroeste Colonial, Fronteira Noroeste, Missões e Celeiro.
Apesar das adversidades enfrentadas na primeira década, a colônia se desenvolveu rapidamente, fruto do investimento em educação, saúde e infraestrutura. A agricultura e a indústria diversificada, com o apoio da Caixa Rural, impulsionaram a economia local. Foi nesse contexto que, em 1915, Serro Azul tornou-se distrito de São Luiz Gonzaga. A população organizou-se politicamente em busca de independência. No entanto, os primeiros movimentos demoraram quase 30 anos para começar, a partir da década de 1940.
Em 1942, um ano antes da formação de uma comissão emancipatória, houve a troca de nome para Cerro Largo. Conforme o historiador Guido Henz, a mudança foi uma exigência do IBGE, pois já havia um município com essa denominação no Paraná. Iniciaram-se então as tratativas com o governo do Estado e de São Luiz Gonzaga, que não queria abrir mão de parte do seu território. Em 1952, finalmente puderam fazer um plebiscito sobre o tema, até que, dois anos depois, a autonomia foi determinada.
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A colônia de imigrantes alemães também fez parte da história do cooperativismo de crédito no Rio Grande do Sul, iniciado em Nova Petrópolis em 1902. Uma década depois, foi a vez de Serro Azul instalar a Caixa Rural (Sparkasse), em setembro de 1913, com 32 sócios.
Conforme o historiador Guido Henz, o sistema foi fundamental para o desenvolvimento da economia local. Por meio dele, os colonos que enfrentavam dificuldades financeiras poderiam pegar recursos emprestados e pagar em juros, resultando no crédito fundiário. A tática beneficiou não apenas o setor agrícola, mas também o industrial e comercial.
Em 1925, a Caixa Rural já contava com 450 associados e foi se tornando uma das mais importantes na região. A partir de 1969, a Sparkasse passou a ser chamada de Cooperativa de Crédito Rural de Cerro Largo (Cooperal) e, quase três décadas depois, viraria o Sistema de Crédito Cooperativo (Sicredi). Diante do legado deixado pelo sistema no município, a Praça da Matriz recebeu, em julho de 2013, um monumento em homenagem aos responsáveis por participar do movimento. Na imponente escultura, pessoas carregam o símbolo do cooperativismo.
Localizado no antigo colégio do Convento Nossa Senhora da Anunciação, o Museu 25 de Julho tem um acervo com mais de 2 mil peças. Documentos, fotografias antigas e objetos ajudam a conhecer um pouco mais dos 120 anos de história do município, desde a chegada dos primeiros imigrantes alemães.
No entanto, há um item peculiar responsável por tornar o espaço famoso em todo o Brasil: a cabeça de uma múmia egípcia. Conforme Guido Henz, um dos responsáveis pelo museu, a peça pertencia a Marcelino Kuntz desde a década de 1950. Foi um presente dado por um egípcio – desconhecido – durante uma viagem ao Rio de Janeiro. Por quase 30 anos, a múmia permaneceu na residência de Kuntz. Até que, no fim de 1970 e início de 1980, prestes a morrer de câncer, decidiu doá-la ao museu.
Em 2017, pesquisadores da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS) levaram a cabeça até a capital para analisá-la. Constataram que é de uma mulher de 42 ou 43 anos que viveu há cerca de 2,5 mil anos no Egito. Batizada de Iret-Neferet, possui um olho esquerdo artificial, colocado durante a mumificação. Segundo as informações do museu, o objeto é considerado um amuleto para os egípcios. Esse aspecto originou o nome da múmia, que em egípcio significa “a mulher de olho bonito”.
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