O Rio Grande do Sul é um Estado multicultural. Ao longo de sua formação, diversos os povos migraram para o Sul do País. Entre eles estavam os imigrantes italianos. Suas tradições foram fundamentais para moldar o que hoje conhecemos como Serra Gaúcha, o que remete especialmente às cidades de Bento Gonçalves, Farroupilha e Caxias do Sul, por ser a terra da uva e do vinho, produtos característicos dos italianos.
Em 2024 celebram-se os 150 anos da chegada dos primeiros imigrantes italianos no País. Eles pisaram em solo brasileiro em fevereiro de 1874, no Espírito Santo, vindos em um navio com aproximadamente 400 pessoas. Eram provenientes principalmente das regiões do Vêneto, do Trentino e da Lombardia, fugindo da pobreza e das difíceis condições de vida na Itália.
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O processo imigratório deixou marcas que são lembradas até hoje na cultura, na economia e nas tradições do Rio Grande do Sul. Concentrados principalmente na Serra Gaúcha, os italianos transformaram cidades em verdadeiros polos de cultura e de desenvolvimento econômico, destacando-se na produção de uvas e na fabricação de vinhos.
A imigração italiana para o Sul do Brasil foi um marco importante na configuração sociocultural da região e reflete um capítulo significativo da expansão capitalista europeia do século 19. Conforme o coordenador do programa de Pós-graduação em História da Universidade de Caxias do Sul (UCS), Roberto Radünz, 59 anos, esse processo de emigração foi profundamente influenciado pelas mudanças socioeconômicas da Europa.
“No período de expansão do capitalismo, o crescimento populacional e a crise econômica resultaram em um excedente demográfico que os mercados de trabalho europeus não conseguiram absorver”, frisa. “Desempregados e miseráveis foram então direcionados por políticas imigrantistas para novos destinos, incluindo a Região Sul do Brasil.”
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De acordo com Radünz, que é natural de Candelária, os imigrantes alemães foram os primeiros a desembarcar no Rio Grande do Sul, iniciando sua colonização em 1824, em São Leopoldo. No entanto, foi a partir de 1875 que os italianos começaram a se estabelecer nas regiões de serra do Estado, em terras então consideradas devolutas pelas autoridades da época.
Embora as autoridades provinciais e imperiais vissem essas terras como desocupadas, populações indígenas estavam presentes e foram gradualmente deslocadas. “O objetivo das autoridades brasileiras era duplo: colonizar a província sulina e abastecer os centros urbanos, como Porto Alegre e as principais áreas escravistas, como Rio Pardo, Encruzilhada e Pelotas, com alimentos e produtos diversos. A colonização visava também substituir, de maneira gradual, a mão de obra escravizada por trabalhadores livres, contribuindo para a expansão do sistema capitalista na região”, explica o coordenador.
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Os imigrantes italianos foram alocados em diversas áreas, incluindo a Quarta Colônia, conhecida também como Silveira Martins, além de outras colônias, como Caxias, Conde D’Eu e Princesa Isabel. Roberto Radünz ressalta que, de 1875 a 1914, por estimativas, entre 74 mil e 100 mil italianos chegaram ao Estado.
“Segundo Olívio Manfroi, em sua obra A colonização italiana no Rio Grande do Sul, dados do recenseamento de 1920 indicam que a população de descendentes italianos poderia chegar a 250 mil na zona de colonização e a aproximadamente 45 mil nos centros urbanos, até 1925”, enfatiza.
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Radünz também comenta a mobilidade natural das populações. Os imigrantes da Serra frequentemente se deslocavam para a região dos vales, e vice-versa, resultando em uma troca cultural significativa. “A influência da imigração italiana é evidente na região da Quarta Colônia, no Centro do Estado, onde traços culturais ainda são visíveis”, aponta.
Foi na Serra Gaúcha que os pioneiros da imigração italiana encontraram um terreno fértil para começar uma nova vida. As colinas da região lembravam as paisagens de suas terras natais, o que facilitou a adaptação ao novo ambiente. Apesar de a cultura italiana no Estado remeter a conhecidas cidades, como Bento Gonçalves e Caxias do Sul, a pequena Antônio Prado, com cerca de 13 mil habitantes, é a cidade mais italiana do Brasil.
De acordo com o histórico da Prefeitura de Antônio Prado, a colonização no local começou quando o primeiro cidadão, Simão David de Oliveira, estabeleceu-se na margem direita do Rio das Antas, em 1880. Ele veio a pé de São Paulo e chegou em território gaúcho via Vacaria.
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A curiosidade de Oliveira em explorar a região o fez chegar até o Rio das Antas, onde prosseguiu caminho até encontrar um lugar melhor para construir seu rancho. Essa localização era o único trecho de terras planas, junto à foz do Rio Leão e do Arroio Tigre, por onde depois, em 1886, foi aberta a primeira picada, que dava acesso à nova colônia italiana chamada Antônio Prado. Conhecida como Passo do Simão, essa picada teve seu nome escolhido em homenagem a Simão David de Oliveira.
Antônio Prado foi a sexta e última das chamadas “antigas colônias da imigração italiana”, fundada em maio de 1886. A partir daí criou-se a nova colônia, e começaram a ser destinadas verbas públicas para abertura de estradas, construção de balsas, medição de terras, construção de barracões, transporte e acolhimento dos colonos.
Apesar dos importantes acontecimentos políticos pelos quais o País passava, como a proclamação da República e a Revolução Federalista, em 1893, não houve interferência no processo de implantação de imigrantes em terras devolutas e cobertas de matas da Serra do Rio das Antas.
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O nome da cidade, Antônio Prado, começou a ser discutido em 1885 pelo imperador do Brasil, Dom Pedro II, e por outras autoridades que, durante o período de 1886 e 1887, criaram um núcleo de colonização na margem direita do Rio das Antas.
Esse núcleo não tinha nome; por isso, o bacharel Manoel Barata Góis, engenheiro-chefe da comissão de medição de lotes, sugeriu e solicitou que fosse dado à nova colônia o nome de Antônio Prado. Foi uma homenagem a Antônio da Silva Prado, fazendeiro paulista que, como ministro da Agricultura da época, promoveu a vinda dos imigrantes italianos ao Brasil, e instalou núcleos coloniais no Rio Grande do Sul.
Neste ano, a cidade, localizada a 207 quilômetros de Santa Cruz do Sul, completou 125 anos de emancipação de Vacaria. Quem visita o local depara-se com a paisagem urbana de casinhas de madeira e alvenaria construídas ainda pelos imigrantes, nos séculos 19 e 20. Elas foram tombadas pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), ainda na década de 1980, devido a sua cultura e importância para o município.
Fotos: Eduardo Lyra/Iphan/Divulgação/GS
Além dos alemães que colonizaram Santa Cruz do Sul, famílias de origem italiana também se instalaram na cidade do Vale do Rio Pardo no século 20. Os italianos marcaram presença expressiva e crescente na região naquela época, e hoje formam um enorme contingente de companheiros no município.
São muitas famílias tradicionais, que se dedicam às áreas de comércio, serviços, indústria, ensino e, claro, à liderança pública, transformando Santa Cruz também em uma piccola Italia para os descendentes.
Aqui preservam hábitos, costumes, tradições, língua, culinária e festas, enriquecendo a cena da socioeconomia regional.
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Para cultivar e preservar as tradições e fomentar a integração dos descendentes, em 12 de julho de 2002 foi criado o Circolo Culturale Bella Italia (CCBI). Atualmente, uma sede própria está sendo construída na Rua Marechal Deodoro, nas proximidades do Cemitério Católico São João Batista.
A cidade de Santa Teresa, na região serrana do Espírito Santo, é reconhecida pela Lei no 13.617, de 11 de janeiro de 2018, como a primeira do Brasil a ser fundada por imigrantes italianos. Esses colonizadores se dedicaram à agricultura, além da cultura do café e de cereais, resgatando ainda hábitos e tradições da terra natal, como o cultivo de videiras.
Os imigrantes trouxeram consigo não apenas suas esperanças, mas também seus costumes e tradições, que permanecem vivos até hoje. As festas típicas, como a Festa da Uva, em Caxias do Sul, e a Fenavinho, em Bento Gonçalves, celebram a cultura típica e são um testemunho da importância dessa comunidade na história local. Além disso, a língua italiana, embora adaptada e misturada com o português ao longo dos anos, ainda é ouvida nas conversas de muitos descendentes.
A gastronomia é outro elemento fundamental desse legado. Pratos como a polenta, o galeto e o tortei são símbolos da cozinha italiana na região. O modo de vida comunitário e o forte senso de família, características marcantes dos imigrantes, ainda são observados na maneira como as famílias dos descendentes se organizam e celebram suas raízes.
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Um dos maiores legados deixados pelos italianos é, sem dúvida, a tradição vitivinícola. Desde os primeiros dias na Serra Gaúcha, as famílias dedicam-se ao cultivo de videiras e à produção de vinhos, transformando a região em um dos principais polos vitivinícolas do Brasil.
A adaptação das videiras ao clima e ao solo da Serra Gaúcha, somada ao conhecimento técnico trazido da Itália, resultou em uma produção de uvas de alta qualidade. Hoje, a região é internacionalmente reconhecida pela excelência de seus vinhos e espumantes.
Embora outros estados, como Santa Catarina e São Paulo, tenham produção de vinho, o Rio Grande do Sul é considerado o maior produtor do País. Rótulos gaúchos são reconhecidos com frequência com títulos mundo afora devido à qualidade dos produtos.
A maior produtora de vinhos no Sul é Flores da Cunha, seguido por Bento Gonçalves, região que mais atrai turistas em virtude do Vale dos Vinhedos, que concentra grande quantidade de vinícolas e restaurantes típicos. As mais famosas são Casa Valduga, Vinícola Aurora, Miolo, Don Laurindo e Lidio Carraro. Caxias do Sul também é reconhecida por seus vinhos; já Garibaldi é considerada a rota dos espumantes. Vinícolas também se estabeleceram em Encruzilhada do Sul.
SEGUE NO PRÓXIMO FINAL DE SEMANA.
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